9º BEC – Meio século entre nós
Cercado pela América do Sul por todos os lados, distante dos portos e com perfil econômico exportador, Mato Grosso é o grande desafio da logística de transporte terrestre nacional. Sua quase continentalidade com mais de 903 mil km² e as rotas preferenciais para escoamento de sua produção de suas regiões exigem respostas sob pena de comprometimento da lucratividade, perda de mercados, e o que é pior: o prejuízo da qualidade de vida de seu povo. Felizmente entre nós há uma instituição capacitada, preparada e permanentemente mobilizada para atender a essa realidade, como faz ao longo de meio século, que é o tempo em que a mesma se encontra entre os habitantes da Terra de Rondon, aos quais se uniu, se fundiu e com os quais se confunde, o 9º Batalhão de Engenharia de Construção (9º BEC), ao qual o site blogdoeduardogomes felicita pela data, que se celebra neste domingo, 31 de janeiro.
Seria redundante falar sobre os feitos do 9º BEC, dentre os quais se destaca a construção da BR-163 no sentido Sul-Norte até Santa Júlia (PA). Mencionar alguns de seus vultos seria cometer injustiça com muitos – pela impossibilidade de citação de todos – tamanha a quantidade de brasileiros que vestiram sua farda e em seus primórdios faziam ecoar o grito “Selva!“. Dizer de sua importância na formação cidadã de milhares que passaram por suas fileiras se torna desnecessário diante do que esses cidadãos fazem, na prática cotidiana. O melhor é reafirmar a crença na capacidade operacional desse centenário batalhão que nos brinda com meio século de sua presença em Cuiabá, onde se instalou em 31 de janeiro de 1971.
Reafirmar a crença no 9º BEC é dizer que Mato Grosso confia que em seu novo endereço de aquartelamento na bela Sinop, numa transferência que se consolidará em 2027, toda sua prática e capacidade operacionais estarão em cena na região que mais precisa de seu contato direto no quase continental Mato Grosso.
O Nortão, que é a região de Sinop, era um grande vazio demográfico em 1971 quando oficialmente começou a abertura da BR-163, que alguns meses antes estava em curso por um grupo precursor de militares. As cidades naquela área, à exceção de Porto dos Gaúchos, nasceram com a rodovia e seus pioneiros chegaram nos rastros das esteiras dos tratores do 9º BEC então comandado pelo coronel José Meirelles.
Com a instalação do 9º BEC em Sinop haverá o reencontro da criatura com um de seus criadores, ao lado da colonizadora que era liderada pelo visionário Ênio Pipino. Que a cada dia esse batalhão se transfira gradualmente para aquela cidade, pois a obra que o espera em seu novo aquartelamento é muito grande.
Dentre os grandes desafios da logística de transporte terrestre nacional, alguns estão à espera do 9º BEC no Nortão. Esse gargalo rodoviário é formado por obras de responsabilidade da União e do governo estadual, mas todas com perfil para serem executadas pela engenharia militar.
A travessia do rio Xingu, na MT-322, que liga o Vale do Araguaia ao Nortão necessita de uma ponte com mais de um quilômetros de extensão em águas profundas inclusive no período da estiagem. Na margem direita está São José do Xingu; do lado oposto, dois municípios: Peixoto de Azevedo e Marcelândia (separados pelo leito da estrada). Essa obra será a mais importante para a interligação regional Leste-Oeste mato-grossense.
A travessia do Juruena na MT-208 entre Nova Bandeirantes e Coriguaçu dificulta a ligação do Nortão com o Noroeste no polo de influência de Colniza. Além da pavimentação o trecho entre as duas cidades necessita de uma ponte para botar fim ao vaivém das balsas com hora marcada nas águas revoltas do Juruena.
Assegurar a ligação de Nova Bandeirantes e Cotriguaçu é importante passo para a criação de um corredor Leste-Oeste entre Rondônia e Pará, cruzando Colniza, Juruena/Cotriguaçu, Nova Bandeirantes, Nova Monte Verde, Alta Floresta, Carlinda, Novo Mundo e Guarantã do Norte. Esse corredor, que é sonho acalentado por lideranças em seu eixo de influência, dependerá do 9º BEC.
Do lado paraense, em Novo Progresso, próximo ao Nortão, a Força Aérea Brasileira (FAB) opera o Campo de Provas Brigadeiro Velloso, conhecido como Base Aérea do Cachimbo, que é uma unidade militar instalada numa área com a dimensão territorial de Sergipe.
Uma vez instalado em Sinop o 9º BEC estará mais próximo da Base Aérea do Cachimbo, e em ações integradas – que também podem ser realizadas mesmo com o acantonamento em Cuiabá, porém, com menos mobilidade – poderá pavimentar pistas de pousos em municípios de região, com infraestrutura para pousos alternativos de aviões da FAB.
No Nortão e imediações há muito para se fazer e o 9º BEC o fará, como o fez tanto em Mato Grosso quanto em seus endereços anteriores desde sua criação em 26 de dezembro de 1917 e sua instalação no dia 2 de janeiro de 1918, em São Gabriel, no Rio Grande do Sul, com o nome de 3º Batalhão de Engenharia.
Desde sua instalação em Cuiabá acompanho a trajetória do 9º BEC e sei que todos nós mato-grossenses devemos muito a ele. Testemunhei o avanço dos tratores abrindo passagem tanto a rodovia quanto ao fluxo migratório que fazia de Mato Grosso o destino daqueles que tinham dificuldades em seus lugares de origem e àqueles que apostavam no amanhã. Antes da obra e acima de Posto Gil (de Diamantino), percorri a Estrada do Rio Novo. Depois, cruzei o Teles Pires e o Peixoto de Azevedo em balsas, e mais tarde em pontes de madeira. Enfrentei os atoleiros em Piúva. No correntão em Posto Gil a vacinação contra a febre amarela era obrigatória e somente seguiam viagem os que justificassem a razão para tanto.
De pronta resposta, o 9º BEC antes mesmo de sua instalação em Cuiabá, iniciou a obra da BR-163. Em 16 de setembro de 1970 militares daquela unidade, que foram seus precursores naquela missão, botaram a mão na massa, mas a construção mesmo teve início em 24 de março de 1971. Os trabalhos foram ancorados em duas equipes: “Bandeirante” e “Disparada”.
Vibrei com o corte da fital inaugural da BR-163. Às 10h30 do dia 20 de outubro de 1976 – portanto há mais de 44 anos – o presidente Ernesto Geisel entregou a rodovia ao tráfego, no Km 877 na Cachoeira do Curuá (PA), numa solenidade que contou com as presenças dos ministros Dirceu de Araújo Nogueira (Transportes) e Sílvio Frota (Exército); do diretor do DNER, engenheiro Adhemar Ribeiro da Silva; dos governadores Aloísio Chaves (Pará) e Garcia Neto (Mato Grosso); e de outras autoridades.
Vi Nova Mutum, Lucas do Rio Verde, Sorriso, Sinop, Itaúba Nova Santa Helena, Terra Nova do Norte, Peixoto de Azevedo, Matupá e Guarantã do Norte brotando no abençoado solo mato-grossense graças ao grande rasgo longitudinal que atende pela nomenclatura BR-163.
Em 2016 publiquei um livro sobre o Nortão e a BR-163, no qual mostrei a relevância do 9º BEC para Mato Grosso. A obra, se é que posso chamá-la assim, recebeu o nome de Nortão BR-163: 46 anos depois. Foi a forma de encontrei para dizer que fui testemunha ocular daquele marco da interiorização do Brasil.
Que Sinop e o Nortão o recebam de braços abertos, 9º BEC; que seja um belo reencontro depois da epopeia da abertura da BR-163 e de sua pavimentação naquela região. Leve consigo a honra de ter o General José Vieira Couto de Magalhães, por patrono. Couto Magalhães governou Mato Grosso e foi quem primeiro sonhou com a construção da BR-163, ideia essa abraçada pelo presidente Juscelino Kubitschek. Inclua em sua bagagem seu novo grito de guerra: Nós fazemos!
Ao comandante do 9º BEC, tenente-coronel Marton Daniel GRALA, seus oficiais, praças e funcionários civis, parabéns pela data e meu renovado agradecimento.
Eduardo Gomes de Andrade – Editor de blogdoeduardogomes
eduardogomes.ega@gmail.com
FOTOS:
1 e 5 – blogdoeduardogomes
2 e 3 – Acervo 9º BEC
4 – Biblioteca Nacional
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