Boa Midia

O novo nome do Shopping Popular de Cuiabá

Eduardo Gomes

@andradeeduardogomes

Em março de 2009 o Supremo Tribunal Federal determinou que os produtores de arroz em Roraima, na área dita Raposa Serra do Sol fossem retirados  de seus lares e suas lavouras, juntamente com seus familiares. Foi uma desintrusão sem precedentes. Faceira e televisiva a Famato enviou àquele Estado uma comitiva de figuras do agronegócio e burocratas em apoio às vítimas do entendimento do STF. Em dezembro de 2012 a mesma Famato não deu o ar da graça na gleba Suiá Missu que era conhecida como Fazenda do Papa, onde por mais de quatro décadas uma comunidade ordeira viveu em paz na vila Estrela do Araguaia (apelidada Posto da Mata), que foi demolida por tratores, e na zona rural sobre 155 mil hectares, onde o Judiciário botou no olho da rua a referida comunidade formada por mais de três mil homens e mulheres  de mãos calejadas, na terceira idade, doentes, jovens, grávidas, crianças, bebês. Roraima era uma vitrine para a Famato se mostrar ao Brasil. Posto da Mata não seria um belo passeio amazônico com direito a entrevistas na Globo, mas uma possibilidade real de enfrentamento com a mão cruel do Estado Brasileiro.

Estrela do Araguaia foi demolida

De perto, em várias oportunidades, acompanhei o sofrimento e a dor dos posseiros expulsos da Fazenda do Papa, que ganhou o pomposo nome de Terra Indígena Marãiwatsédé transformando-se assim numa área Xavante, onde o cacique-geral Damião Paridzane arrenda pastagens para milhares de bovinos de pecuaristas da região, como o próprio reconhece e a Funai, Ministério Público Federal, Polícia Federal e Indea sabem, mas nenhuma providência é tomada. Os arrancados de suas casas foram amontoados numa área arenosa e sem água em Alto Boa Vista, que ganhou o irreverente nome de Saara, dado pela sabedoria popular. Pior: alguns não suportaram o trauma e  o suícidio foi tudo que lhes restou. A face solidária que a Famato exibiu em Roraima não foi manifestada no Saara, onde o governo estadual também não esteve presente.

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Em maio a tragédia climática que enlutou o Rio Grande do Sul teve repercussão em Mato Grosso, onde além de incontáveis doações de alimentos, medicamentos, ração para pets, agasalhos, brinquedos, calçados e outros itens doados pela generosidade mato-grossense, também resultou num depósito bancário de 50 milhões de reais doados pelo governo estadual representado por seu titular Mauro Mendes com a devida aquiescência da Assembleia Legislativa.

Na segunda, 15, um incêndio transformou o Shopping Popular de Cuiabá num monte de cinzas. Ao menos 600 boxes onde havia intenso comércio varejista diversificado foram destruídos. O mesmo fogaréu tomou – ainda que temporariamente – o emprego de três mil funcionários.

Os produtores de arroz em Roraima precisavam da mão estendida de Mato Grosso, muito embora veja o passeio amazônico até lá, feito pela Famato, como pirotecnia externa, a julgar pela omissão daquela entidade ruralista no triste episódio na Fazenda do Papa.

O socorro financeiro ao Rio Grande do Sul foi justo. Injusto seria se  esse tipo de ajuda não fosse destinada a irmãos brasileiros em outros estados desde que em situação análoga àquela.

No episódio em Roraima não houve desembolso direto do governo estadual e a Famato poderia fazer o que bem entendesse com as reservas em seus cofres e contas bancárias. Porém, para o Rio Grande do Sul foi enviado dinheiro do cidadão mato-grossense, e essa ação que não posso chamar de precedente tem que ser repetida agora, de imediato, em relação ao Shopping Popular.

O Shopping Popular era assim e…

Vi movimentação de autoridades políticas lideradas pelo governador em exercício Otaviano Pivetta pela restauração da estrutura danificada e o amparo aos comerciantes e funcionários atingidos. Também vi o presidente Lula afirmar ao lado do ministro Carlos Fávaro (Agricultura) que o governo federal agirá e que em breve “teremos boas notícias”. Porém, nem Pivetta nem Lula foram tão cirúrgicos quanto a movimentação de deputados e produtores rurais para que Mauro Mendes liberasse os recursos aos gaúchos.

... Ficou assim

A sabedoria popular nos ensina que a solidariedade política não costuma ir além da missa de sétimo dia. Mato Grosso tem reservas orçamentárias que podem ser utilizadas na rápida reconstrução do Shopping Popular e conta com meios para financiar e fomentar a atividade camelô – que na realidade é a profissão dos comerciantes naquele local.

A triste página escrita pela Famato sobre a Fazenda do Papa não pode ser copiada por analogia pelo governo estadual, que foi generoso com o Rio Grande do Sul e não deve ser abstrato com os camelôs.  É hora da Assembleia Legislativa interromper o recesso parlamentar de julho, voltar ao plenário e aprovar um mecanismo que traga de volta o Shopping Popular com seus personagens, alegria, virtudes, defeitos e o colorido do vaivém de seus clientes que fazem parte da população mato-grossense.

Lamentável a indiferença da Famato com os moradores na Fazenda do Papa. Louvável o socorro aos gaúchos. Deixemos o passado para ser julgado pela história. Fiquemos no presente onde o nome do Shopping Popular de Cuiabá é Rio Grande do Sul.

3 Comentários
  1. Celino Teodoro Diz

    Pois é…Pois é…Não podemos/não devemos aceitar nada mais/nada menos que UMA DOACAO POMPOSA E GORDA aos nossos irmãos cuiabanos…Será uma segunda tragédia – talvez ate maior q o incêndio – se o Estado de MT, não DOAR recursos financeiros a estes cidadãos/cidadãs q perderam tudo…E n tô falando apenas de ajuda p recomeçarem, aos donos dos estabelecimentos, mais tbm aos funcionários/trabalhadores que perderam o emprego, e precisam comer, pagar agua/luz, e suas dívidas…Parabéns @Eduardo Gomes pelo belíssimo texto…

    Celino Teodoro – Tecnólogo – Rondonópolis – via grupo de WhatsApp Boamidia

  2. Valdecy Vieira Diz

    Tem assuntos que até pra ler sobre, temos que ser fortes, imaginam viver.

    Valdecy Vieira- Professor – Conselvan (de Aripuanã) – via grupo de WhatsApp Boamidia

  3. Marinaldo Custódio Diz

    Belo, grandioso! Terrível!

    Marinaldo Custódio – Professor, escritor e jornalista – Cuiabá- via WhatsApp

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