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RONDONÓPOLIS – Governo não repassa recursos e UTI Pediátrica fecha

Santa Casa da UTI 'sanfona' em Rondonópolis
Santa Casa da UTI ‘sanfona’ em Rondonópolis

Sanfona. Este é um nome apropriado para a UTI Pediátrica da Santa Casa de Rondonópolis, que ora abre ora fecha. No vaivém do imaginário crianças ficam entregues à própria sorte, sem a presença obrigatória do Estado Brasileiro com base no princípio constitucional “Saúde é direito do cidadão e dever do Estado“. Não há registro sobre as sequelas e quem sabe morte dos pequeninos jogados ao léu. Na quinta-feira, 19, a direção da Santa Casa oficializou a suspensão do atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e no dia seguinte, 20, bateu as portas na cara dos que procuraram por socorro médico.

O fechamento da UTI foi o tiro de misericórdia numa das áreas mais sensíveis da saúde pública. Antes dessa decisão, em 5 deste julho, aquela unidade não recebia novos pacientes.

O caos em Rondonópolis é apenas um dente da criminosa engrenagem que menospreza e sucateia os hospitais filantrópicos mato-grossenses desde a posse do governador Pedro Taques em janeiro de 2015. No caso da Santa Casa rondonopolitana a situação ainda fica mais complicada por três fatores: sua diretoria esconde o jogo e não revela com a transparência necessária o fluxo de repasses que recebe dos entes tripartites do SUS (com valores, datas e destinações), o prefeito Zé Carlos do Pátio a considera “saco sem fundo” e Pedro faz jogo de palavras.

Mesmo em se tratando de hospital filantrópico, basicamente mantido por recursos públicos, a Santa Casa  de Rondonópolis é um poço de silêncio sobre recursos e somente aborda a questão para apontar o dedo sobre o descompromisso do Estado e da prefeitura com os repasses, além de choramingar criticando a Tabela do SUS..

Pátio: (Santa Casa) aquilo é saco sem fundo
Zé do Pátio: (Santa Casa) aquilo lá é saco sem fundo

Pedro, o governador, em média mantém atrasos de seis meses com os compromissos do governo, incluindo os deveres constitucionais de repasse do duodécimo e  outras transferências; no repasse do Fundo Estadual de Habitação e Transporte (Fethab); no cumprimento de convênios etc. Na terça-feira, 17, Pedro reuniu jornalistas no Palácio Paiaguás para um almoço onde apresentaria números de seu governo. No evento (que teve forte conotação de propaganda eleitoral extemporânea bancada pelo governo – que patrocinou a boca livre) ao ouvi-lo chamar a questão da Santa Casa de Rondonópolis de “falsa crise”, pedi a palavra e o retruquei. Disse a ele na presença dos colegas jornalistas, que a crise é real, que o atraso é crônico e pedi que seu governo respeitasse nossos pequeninos. Pedro respondeu que houve avanço na saúde em Rondonópolis – concordei em parte -, que não tem pendências (com a Santa Casa) relativa a anos anteriores e que pagou parte dos compromissos das obrigações mensais de 2018. Resumi justificando aos jornalistas que a tudo ouviram em silêncio, que não estava ali para falar, mas sim para ouvir, e que minha reação foi a de um cidadão indignado.

Zé do Pátio nunca escondeu seu desprezo pela Santa Casa. Conversei com ele no dia 17, no corredor do Palácio Paiaguás. O prefeito foi àquele local para uma conversa com Pedro, e estava acompanhado pelo deputado federal Paulinho da Força (de São Paulo),  líder nacional de seu partido, o Solidariedade. Falando ao meu ouvido, para que os repórteres ao lado não ouvissem, revelou que “estou (a prefeitura)  mais ou menos certo com a Santa Casa. Acabei de repassar um dinheiro para eles; se estou atrasado com um dos repasses tenho adiantamento em outra área (segundo ele, o município faz várias transferências para atender diversos setores do hospital)”. Perguntei qual seria a razão para a permanente crise na Santa Casa. Ele botou a mão no meu obro, abriu um sorriso e sem se preocupar em ser ouvido pelos demais, disse, “Aquilo lá (a Santa Casa) é um saco sem fundo”.

Meu encontro com Zé do Pátio aconteceu no dia 17, antes do almoço dos jornalistas com Pedro. Uma fonte revelou que ele ali se encontrava para discutir com o anfitrião a composição de sua chapa ao governo, com sua mulher, Neuma Morais de vice-governadora. Para reforçar essa tese, Paulinho da Força o acompanhava. Na coletiva com o governador perguntei se Neuma faria ou não dobradinha com ele. Pedro respondeu enigmático que uma mulher estaria sendo cogitada para a chapa, elogiou Neuma, mas não bateu o martelo.

 

BATALHA – Quando do fechamento da UTI havia uma criança internada, que foi transferida para a UTI Neonatal, num leito adaptado. A suspensão do atendimento estava prevista para antes, no dia 15, mas de última hora a Santa Casa deu aquilo que se chama ‘voto de confiança’ ao governo, na esperança de receber os repasses em aberto, mas o governo não conseguiu ou não quis fazer a transferência do montante que somente Deus sabe quanto é.

O voto de confiança nasceu de uma reunião no dia 12 deste julho, na Assembleia Legislativa, entre diretores da Santa Casa, deputados e representantes da Saúde do Estado e de Rondonópolis. Um entendimento entre as partes definiu que na semana seguinte (de 16 a 19) aquele hospital filantrópico receberia R$ 2,5 milhões para amenizar a crise instalada em suas finanças. Essa dinheirama seria para pagamento aos médicos intensivistas, que desde fevereiro não recebem seus salários. Uma fonte sustenta que todos pediram demissão.

Para complicar o cenário, a Santa Casa anunciou que a partir de 3 de agosto suspenderá todos os procedimentos feitos sob agendamentos, os chamados eletivos. Tanto o fechamento da UTI Pediátrica quanto a suspensão de exames e cirurgias atendadas atingirão usuários do SUS no município e sua raio de influência regional.

Agosto 2016 - Pedro inaugura UTI montada com recursos de bloqueio de contas pelo Ministério Público
Agosto 2016 – Pedro inaugura UTI montada com recursos de bloqueio de contas pelo Ministério Público

MEMÓRIA – Em novembro de 2017 a UTI Pediátrica fechou pela primeira vez.

Rondonópolis é referência em saúde no seu polo que atende usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) residentes naquele e em outros 18 municípios. A UTI Pediátrica da Santa Casa  é a pioneira na região e sua inauguração aconteceu em 23 de agosto de 2016, com Pedro cortando uma fita simbólica. Sua conquista foi resultado de uma luta que se arrastou por mais de uma década. O funcionamento começou em setembro daquele ano, mas foi interrompido por falta de recursos, uma vez que o governo Taques não repassa o montante mensal de R$ 1.042.500 fundo a fundo, conforme previsto em acordo oficial.

Antes mesmo de entrar em funcionamento a UTI já enfrentava o descaso do governo. Taques não repassou R$ 3.712.693,89 para sua conclusão, conforme compromisso então existente. Para que o montante fosse liberado o promotor de Justiça Ari Madeira Costa pediu o bloqueio judicial do correspondente e a Justiça o atendeu.

O funcionamento depende de recursos do governo de Pedro, para custeio e manutenção de oito leitos pediátricos; e de sete leitos neonatais, cinco leitos neonatais de cuidado intermediário Canguru, 10 leitos de cuidado intermediário convencional; e de 10 leitos neonatais e 16 leitos de retaguarda pediátrica que existiam antes da inauguração da Ala Pediátrica em agosto de 2016. São 56 leitos.

AGUARDEM – A próxima postagem sobre o caso focalizará o presidente da associação dos prefeitos (AMM), Neurilan Fraga, que apresentará números e dados oficiais dos atrasos de repasses do governo Pedro aos municípios.

 

Eduardo Gomes/blogdoeduardogomes

FOTOS:

1 e 2 – Eduardo Gomes

3 – Arquivo: Gabinete de Comunicação do Governo de Mato Grosso

 

 

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