Pra Mato Grosso refletir sobre Pedro Taques, Mussolini e Rondon
Mato Grosso viveu dois períodos cinzentos em sua trajetória institucional. Primeiro com a Máfia das Ambulâncias, escândalo que ganhou as manchetes nacionais em 2006 com o título de Sanguessugas e que terminou na mais absoluta impunidade. Depois, com a prática disseminada do grampo telefônico, que também descamba para fim idêntico ao primeiro caso, quando muito condenando a arraia-miúda envolvida com aquele crime repugnante.
A Máfia das Ambulâncias não é o objeto deste editorial. Esse caso será tratado com igual profundidade e isenção, ao do grampo telefônico, tema deste texto. Não se pode dizer que os dois casos são análogos. São distintos. O primeiro envolveu dezenas de prefeitos, quase toda a bancada federal da época, a estrutura da Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM) na figura de seu então presidente Cidinho dos Santos e a extinta empresa Planam. O atual foi operacionalizado por boa parte da cúpula da Segurança Pública para ‘beneficiar’ o governador Pedro Taques.
O objetivo não é repetir informações sobre o repugnante crime das gravações clandestinas, que recebeu o nome popular de “Grampolândia Pantaneira”. Não; isso é de domínio público, mas mesmo assim é importante reforçar que sua operacionalização – segundo as investigações, evidências, depoimentos, denúncias etc. – levou as digitais de Paulo Taques, primo do governador Pedro Taques, que coordenou sua campanha ao governo e chefiou a Casa Civil; dos coronéis da PM Zaqueu Barbosa, ex-comandante-geral; Evandro Lesco, ex-chefe da Casa Militar; Ronelson Barros, ex-subchefe da Casa Militar; Airton Benedito Siqueira Júnior, ex-secretário de Justiça e Direitos Humanos; e do delegado da Polícia Civil, Rogers Jarbas, ex-secretário de Segurança Pública.
Boa parte da cúpula da Segurança Pública do governador Pedro Taques viveu, respirou e vibrou com Grampolândia Pantaneira. Paulo Taques foi onipresente na cadeia dos grampos, a julgar pelo recente depoimento do cabo da PM, Gérson Corrêa Júnior à 11ª Vara Criminal de Cuiabá, no qual detalhou a operação criminosa citando inclusive que os primeiros recursos financeiros para sua execução – R$ 50 mil – lhe foram entregues em espécie por Paulo Taques. O mesmo policial militar graduado apontou Paulo Taques e Pedro Taques como chefes do esquema de escutas clandestinas.
Parte da estrutura do poder a serviço de Pedro Taques nas áreas de Segurança Pública e política encontrou outra função: criminosamente ouvir o que diziam ao telefone os adversários políticos do governador, além de advogados, jornalistas, médicos, servidores públicos e outros cidadãos. O desembargador do Tribunal de Justiça, Orlando Perri, que em determinado período esteve à frente da ação sobre Grampolândia Pantaneira, disse que 70 mil foram gravados. Provavelmente o magistrado se referiu ao número de escutas clandestinas e não ao total de vítimas.
Grampolândia Pantaneira chegou ao conhecimento público em maio do ano passado numa reportagem do Fantástico da Rede Globo, que ouviu o promotor de Justiça e ex-secretário de Segurança Pública, Mauro Zaque, autor da denúncia sobre esse crime. Desde então a Assembleia Legislativa não tomou nenhuma providência. Mergulhada em escândalos e com o deputado Mauro Savi (DEM) preso sob suspeita de integrar uma organização criminosa que desviou R$ 30 milhões do Detran, a Assembleia ficou em silêncio e sempre submissa a Pedro Taques. Agora, às vésperas de eleição, o deputado Romoaldo Júnior (MDB) aventa a possibilidade de tentar criar uma CPI para investigar o caso. Vale observar que nenhuma CPI instalada na Assembleia alcançou os objetivos que levaram à sua criação.
Portanto, não se pode esperar nada da Assembleia. A ação judicial sobre Grampolândia se arrastará por muito tempo ainda e não se resumirá às sentenças em primeira instância. Ou seja, a lentidão judicial será benéfica aos criminosos, inclusive ao réu confesso, o cabo Gérson Corrêa.
Em recente entrevista ao blogdoeduardogomes o deputado federal e presidente regional do MDB, Carlos Bezerra, chamou o grampo de prática fascista do governo de Pedro Taques e o Palácio Paiaguás não o retrucou. Bezerra foi uma das poucas vozes a se levantar contra esse crime. Mato Grosso tem perfil governista e não costuma criticar quem está no poder. Nas redes sociais poucos se atrevem a criticar Pedro Taques pelo grampo. As matérias sobre o caso são elaboradas com cuidado para não trombarem com o poder anunciante da máquina publicitária do governo e, além disso, há temor generalizado de retaliação por parte de Pedro Taques.
Pedro Taques sobreviverá. Chegará às eleições em outubro sem carregar a chancela oficial da Grampolândia Pantaneira. Isso graças ao silêncio quase coletivo de Mato Grosso. Isso, pela ausência da cobrança popular. Isso pela conivência da maior parte da imprensa. Isso, pela falta de uma Assembleia Legislativa soberana. Isso pela morosidade judicial. Isso pela falta de cidadania nos textos postados nas redes sociais.
Em outubro Pedro Taques poderá não somente conquistar novo mandato de governador. Mais que isso: poderá encontrar o caminho seguro que lhe dê oportunidade para novamente estar à frente de um secretariado disposto a tudo para blindá-lo, ainda que para tanto tenha que lançar mão de expediente criminoso como é o caso da Grampolândia Pantaneira, crime capaz de levar a ossada de Benito Mussolini ao delírio pela continuidade de suas práticas, agora aperfeiçoadas no Estado do Patrono das Comunicações, o nosso herói Marechal Rondon, que deve se revirar no túmulo pela falta de reação cidadã nessa terra onde a população é violentada e não reage.
Eduardo Gomes/blogdoeduardogomes
FOTOS: Arquivo
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