Boa Midia

A cidade da arara Mancho

Mancho recepcionando uma moto
Mancho recepcionando uma moto

Imponente. Absoluta. Linda. Livre, totalmente livre. Senhora dos ares e dengo na terra. Mancho (pronuncia-se mantcho) era uma arara singular. Exuberante no vermelho predominante em sua plumagem pontilhada pelo verde, azul e amarelo. Não se deixava urbanizar embora vivesse numa vila agitada pelo vaivém dos carros e tratores agrícolas. De vez em quando batia asas, sumia do seu dono em longas e demoradas revoadas em bandos. Assim como ia, voltava.

Chuva, muita chuva. Estrada com atoleiros. Chego a Santa Rita no final do ano de 1996. O compromisso é a cobertura de um mutirão rural do Sistema Famato (da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso). Porém, ao entrar na vila tiro do pensamento a razão da minha viagem. Sou recebido por Mantcho, que num quá-quá-quá-quá de algazarra sobrevoa meu Gol. Depois dessa apresentação a ave posiciona-se sobre o carro como se fosse um guardião aéreo me escoltando sem adiantar nem atrasar. Faz um voo sincronizado com o carro. Achei aquilo fenomenal.

Cheguei ao local do Mutirão e fui apresentado a Edgar Matschinske, o dono de Mancho. Edgar era apaixonado por sua ave, que seu filho Adilson Matschinske encontrou filhotinho num ninho caído nas matas do rio Teles Pires e o levou para casa.

Com carinho, Edgar criou Mancho sem jamais botá-lo na gaiola ou cortar suas asas. A paixão era recíproca – isso posso atestar – pois alguns minutos após o início da nossa conversa a ave entrou no recinto, localizou seu protetor, pousou em seu ombro e em silêncio ofereceu a cabeça pedindo um cafuné.

Edgar e Mancho não estão mais entre nós. Ele tombou cheio de vitalidade durante uma partida de futebol, vítima de um infarto traiçoeiro e fulminante. Mancho fechou os olhos para sempre quando um trator o esmagou.

Ilson Matschinske, irmão de Edgar, era vereador por Nova Mutum, município ao qual a vila de Santa Rita pertencia e tratou de batizar a via principal do lugar de Rua da Arara. Depois, com a emancipação, Ilson foi eleito o primeiro prefeito e se reelegeu. Ilson também não está mais entre nós: ele, Edgar e Mancho voltaram ao Criador.

PS – Trecho extraído do capítulo dedicado a Santa Rita do Trivelato no livro NORTÃO: BR-163: 46 ANOS DEPOIS publicado pelo jornalista Eduardo Gomes de Andrade em 2016, sem apoio das leis de incentivos culturais.

Santa Rita do Trivelato é um dos 35 municípios do Nortão e um importante produtor de soja, algodão e milho safrinha. Tem 18 anos de instalação e sua população é de 3.330 habitantes. A cidade, no polo de Nova Mutum, dista 110 quilômetros da BR-163, pela MT-235.

FOTO: Arquivo de 1996 – Eduardo Gomes de Andrade 

 

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