40 Anos – Cuiabá engessada
Transcorridos 40 anos da divisão territorial Cuiabá enfrenta sérios problemas pela indecisão, lentidão e indiferença do governo estadual. Quatro das mais importantes obras públicas para a capital mato-grossense estão paralisadas, abandonadas pelo governo estadual. Cidade da Saúde, VLT, Hospital Universitário Júlio Müller e Rodoanel Norte saíram do sonho cuiabano e viraram pesadelo. Nesse contexto Várzea Grande também é diretamente atingida porque o projeto do VLT tem parte de suas linhas naquela cidade. Em suma Cuiabá sofre engessamento.
VLT descarrila
Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) é motivo de chacota em Mato Grosso. Em outubro de 2011 o governo estadual de braços dados com a Assembleia Legislativa optou pelo VLT em detrimento do BRT (sistema de ônibus rápido, na tradução livre do inglês). O projeto era construir 22,2 quilômetros de linhas em Várzea Grande e Cuiabá. O custo da aventura: R$ 1,477 bilhão com financiamento já que Mato Grosso não tinha recursos para tanto.
No final de 2014, com mais de um bilhão de reais consumidos, havia seis quilômetros de trilhos construídos, duas estações de embarque parcialmente prontas em Várzea Grande e os vagões jogados num canto à espera da conclusão da obra.
Pedro Taques assumiu o governo em 1º de janeiro de 2015 e o VLT virou suco. Reuniões, debates, intervenções do Ministério Público Federal, queda de braço com o Consórcio VLT Cuiabá-Várzea Grande – que executava a obra – e o trem saiu do trilho definitivamente.
Os últimos lances do VLT. Em 28 de julho deste ano o juiz Ciro José de Andrade Arapiraca, da 8ª Vara Federal de Cuiabá, concedeu 20 dias úteis para que o governo estadual respondesse às dúvidas sobre a retomada da obra. O prazo venceria em 26 de agosto, mas na véspera o secretário de Cidades, Wilson Santos, suspendeu o diálogo com o Consórcio VLT e comunicou ao magistrado que seu governo deixaria de lado o plano para a retomada da construção.
Agora, definitivamente o VLT descarrilou.
Cidade da Saúde
Iniciado em 1985 e com sua construção paralisada 10 anos depois, o Hospital Central de Cuiabá desafia sucessivos governos que não conseguem concluí-lo. Seu projeto previa 136 leitos, centro cirúrgico e outras instalações. Sua obra seria bancada pelo Ministério da Saúde em parceria com o governo estadual.
Em 17 de dezembro de 2005, o governador Pedro Taques realizou uma solenidade para anunciar a criação da “Cidade da Saúde”, que seria construída sobre o esqueleto do desafiante hospital.
No ato Pedro Taques destinou R$ 6,5 milhões para uma das alas da Cidade da Saúde, na qual funcionaria o Centro de Reabilitação Integral Dom Aquino Corrêa (Cridac), Centro Estadual de Referência de Média e Alta Complexidade (Cermac), Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), Hemocentro e o Hospital Materno Infantil. O compromisso assumido pelo governador não foi cumprido. No local resta apenas a placa que anunciava a obra.
Hospital Júlio Müller
Ninguém sabe ao certo o que será feito do esqueleto parcial do Hospital Universitário Júlio Müller iniciado em novembro de 2012 e com sua obra paralisada desde o final de 2014. Pouco se sabe sobre ele. Dentre as informações, três de destaque: seria construído em parceria pelo Ministério da Educação (MEC) e o governo estadual, seria inaugurado antes da Copa do Mundo de 2014 e a área onde começou a ser erguido é um pântano à margem da MT-040 que liga Cuiabá a Santo Antônio de Leverger.
Não há hoje nem sonho sobre o hospital, cujo projeto previa uma área construída de 43 mil m² com capacidade para 300 leitos, sobre um terreno de 147 hectares. Numa escala de zero a 100 sua construção quando parou estava na faixa de 8%. Seu custo inicial seria de R$ 116 milhões. Governo estadual e a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), que é a voz do MEC na obra, batem cabeça. Não se sabe ao certo o montante até agora desembolsado nem quanto há de recursos em caixa.
Desde a posse de Pedro Taques em 1º de janeiro de 2015 o governo de Mato Grosso não investiu um centavo de real sequer na obra. Quando da definição da escolha do local para a construção a bancada federal fez vistas grossas e um dos congressistas à época era Pedro Taques, que exercia mandato de senador. Outros dois membros da bancada de então fazem desse hospital bandeira política: o senador Wellington Fagundes (PR) era deputado federal, e Valtenir Pereira (PSB) foi reeleito para o cargo.
Rodoanel
Com 51,7 quilômetros de extensão o projeto do Contorno Norte prevê sua construção em pista dupla ligando as rodovias remontadas BR-070/163/364 na altura do recinto de leilões da Estância Bahia, na saída de Cuiabá para Rondonópolis, até o trecho coincidente da BR-364/163 nas imediações do Trevo do Lagarto, em Várzea Grande. Terá pontes sobre os rios Cuiabá, Coxipó e dos Couros e viadutos em seus pontos extremos, além de outros nos cruzamentos com as rodovias estaduais: Emanuel Pinheiro (MT-251 de acesso a Chapada dos Guimarães), Arquiteto Helder Cândia (MT-010 de acesso a Acorizal) e o antigo leito da MT-010 na região da vila Sucuri.
A construção do Contorno Norte começou em novembro de 2006 por meio de uma parceria do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) com a prefeitura de Cuiabá – que assumiu responsabilidade por sua execução -, mas o projeto previa pista simples e não incluía um trecho de 12 quilômetros estendendo-o ao município de Várzea Grande (até a BR-364/163) nem a ponte sobre o rio Cuiabá no limite dos dois municípios. Quando de seu lançamento o então prefeito tucano da capital, Wilson Santos, anunciou seu término em 2013. À época seu custo foi orçado em R$ 42 milhões com recursos do Dnit e de emendas do então senador Antero Paes de Barros/PSDB e dos deputados federais à época, Wellington Fagundes(PR) e Thelma de Oliveira (PSDB); agora Wellington é senador e Thelma prefeita de Chapada dos Guimarães.
Três anos depois de iniciar o rodoanel e após embolsar R$ 19 milhões a empresa Conspavi, contratada para executar o serviço, desmontou o canteiro de obras alegando falta de recebimento. No rastro desse projeto o Tribunal de Contas da União (TCU) e uma auditoria do Dnit encontraram um rombo de R$ 10 milhões, que teriam sido superfaturados na pavimentação de oito quilômetros pela Conspavi.
Em fevereiro de 2011, o então presidente do Dnit, Luiz Antônio Pagot, trocou farpas pela imprensa com o dono da Conspavi, Luiz Carlos Félix, o Caxito. As acusações foram muitas. Caxito disse que Pagot tumultuou a obra para transferi-la a empreiteiros ligados a ele. Pagot rebateu criticando a qualidade e o custo do rodoanel. O fuzuê entre os dois acabou e não chegou aos tribunais.
Um convênio de R$ 354 milhões firmado em novembro de 2012 entre o governo de Mato Grosso e o Dnit asseguraria repasse de R$ 318 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2) ao Estado para a conclusão do Contorno Norte. A obra também receberia R$ 36 milhões de emendas do à época deputado federal Wellington Fagundes e do então deputado federal Homero Pereira (PSD), já falecido. O recurso do PAC seria desembolsado em parcelas a partir de 2013, mas o dinheiro das emendas deveria cair na conta de Mato Grosso ainda em dezembro daquele ano. A previsão era que a fita simbólica fosse cortada em três anos. Até agora, nada.
Com a obra paralisada e fortes indícios de superfaturamento o juiz federal da 8ª Vara Federal em Cuiabá, Fábio Henrique Rodrigues de Moraes Fiorenza bloqueou bens até o valor de R$ 22,9 milhões de Wilson Santos, Andelson Gil do Amaral, Josué de Souza Júnior, Manoel Avalone e Luís Francisco Félix, e ainda das construtoras Três Irmãos Engenharia e Conspavi Construção e Participação. O bloqueio foi ordenado em 9 de janeiro de 2015, quando Wilson Santos (PSDB) era deputado estadual eleito e aguardava a posse, que aconteceu no dia 1º do mês seguinte. Wilson Santos alega inocência.
Dois personagens do fracasso da obra ganharam mimos do governador Pedro Taques. Wilson Santos foi nomeado secretário de Cidades e deixou a Assembleia temporariamente para integrar a equipe de Taques; a caneta que nomeou Wilson Santos também nomeou Carlos Avalone – um dos donos da construtora Três Irmãos Engenharia – secretário de Desenvolvimento Econômico.
Detalhes: Esse elefante branco foi incluído ao pacote de 66 obras do programa “Pró-Estradas Vale do Rio Cuiabá”, lançado por Pedro Taques em 13 de novembro de 2015, para ser executado em 13 municípios. O programa teria R$ 1 bilhão, dinheirama essa do Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab), Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (DNDES) por meio do programa Pró-Turismo, Banco do Brasil e da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).
Elefante branco, a obra inacabada tem dois nomes nascidos da generosidade política dos grupos dominantes em Cuiabá. Rodoanel Mário Covas e Rodoanel Jonas Pinheiro, mas nenhum emplacou. A ironia popular passou a chama-lo Rouboanel.
EDUARDO GOMES/blogdoeduardogomes
Fotos 1 – José Medeiros – 2 Édson Rodrigues – 3 Redação – 4 Assessoria senador Wellington Fagundes
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