História sem fim do Contorno Norte tem novo capítulo
Para mostrar ao eleitor o que faz o governo federal e sua sustentação política, o chefe do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) em Mato Grosso, Orlando Fanaia, apresentou à prefeita de Várzea Grande, Lucimar Campos, o esboço do que será o Contorno Norte da área metropolitana, o chamado Rodoanel Norte, obra orçada em R$ 500 milhões e com R$ 110 milhões em caixa para seu começo.
Fanaia não é mágico nem tem coelho na cartola. Portanto, não sabe de onde virão os R$ 390 milhões restantes para a conclusão da obra que – pasmem! – será executada pelo manjado Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), artifício que abre perigosas brechas na relação entre contratante e contratado.
O esboço oficialmente é preprojeto de engenharia elaborado pela Secretaria de Infraestrutura e Logística (Sinfra), do governo estadual O projeto será de autoria da felizarda vencedora do RDC, que executará o Contorno Norte em lote único.
O Contorno Norte, se construído, absorverá o tráfego das rodovias federais 070,163 e 364 no trecho urbano da capital e Várzea Grande, além de interligar as rodovias estaduais 010 e 251.
No apagar das luzes do mandato do presidente Michel Temer, apresentar um anteprojeto de uma obra em Mato Grosso para a qual serão necessários mais R$ 390 milhões, é algo quando nada suspeito. Mesmo assim, nenhuma voz se levanta para questionar o que se esconde por trás desse lançamento. Duas das principais forças políticas mato-grossenses querem tirar proveito eleitoral dela: para o grupo tucano do governador Pedro Taques, o barulho sobre a obra retira o foco de sua suspensão pelo Tribunal de Contas da União (TCU), por suspeita de superfaturamento quando de seu começo, em 2006, e que resultou no bloqueio de bens do deputado estadual tucano Wilson Santos, que foi secretário de Pedro e virou um de seus mais influentes assessores. Para o senador Wellington Fagundes (PR), que é pré-candidato ao governo e costuma mostrar o Contorno Norte como uma de suas conquistas em Brasília para Mato Grosso.
A obra
Com 51,7 km de extensão, o projeto do Contorno Norte prevê sua construção em pista dupla ligando as rodovias remontadas BR-070/163/364 na altura do recinto de leilões da Estância Bahia, na saída de Cuiabá para Rondonópolis, e avançará até a BR-364/163 nas imediações do Trevo do Lagarto, em Várzea Grande. Terá pontes sobre os rios Cuiabá, Coxipó e dos Couros e viadutos em seus pontos de começo e fim, além de outros nos cruzamentos com as rodovias estaduais: Emanuel Pinheiro (MT-251 de acesso a Chapada dos Guimarães), Helder Cândia (MT-010 de acesso a Acorizal) e o antigo leito da MT-010 na região da vila Sucuri.
A construção do Contorno Norte começou em novembro de 2006 por meio de uma parceria do Dnit com a prefeitura de Cuiabá – que assumiu responsabilidade por sua execução -, mas o projeto previa pista simples e não incluía o trecho de 12 quilômetros de sua extensão no município de Várzea Grande nem a ponte sobre o rio Cuiabá no limite dos dois municípios. Quando de seu lançamento, o então prefeito tucano da capital, Wilson Santos, anunciou que seu término seria em 2013. À época, seu custo foi orçado em R$ 42 milhões com recursos do Dnit e de emendas do então senador Antero Paes de Barros (PSDB) e dos à época deputados federais Wellington Fagundes (PR) e Thelma de Oliveira (PSDB).
Três anos depois de iniciar o Rodoanel e após embolsar R$ 19 milhões, a empresa Conspavi, contratada para executar o serviço, fechou o canteiro de obras alegando falta de recebimento. No rastro desse projeto o Tribunal de Contas da União (TCU) e uma auditoria do Dnit encontraram um rombo de R$ 10 milhões, que teriam sido superfaturados na pavimentação de 8 quilômetros pela Conspavi.
Em fevereiro de 2011, o então presidente do Dnit, Luiz Antônio Pagot, trocou farpas pela imprensa com o dono da Conspavi, Luiz Carlos Félix, o Caxito. As acusações foram muitas. Caxito disse que Pagot tumultuou a obra para transferi-la a empreiteiros ligados a ele; Pagot rebateu criticando a qualidade e o custo do Rodoanel. O fuzuê entre os dois acabou e não chegou aos tribunais.
Um convênio de R$ 354 milhões firmado em novembro de 2012 entre o governo de Mato Grosso e o Dnit asseguraria repasse de R$ 318 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2) ao Estado para a conclusão do Contorno Norte. A obra também receberia R$ 36 milhões de emendas dos à época deputados federal Wellington Fagundes e Homero Pereira (PSD), já falecido.
O recurso do PAC seria desembolsado em parcelas a partir de 2013, mas o dinheiro das emendas deveria cair na conta de Mato Grosso ainda em dezembro daquele ano. A previsão era que a fita simbólica fosse cortada em três anos. Até agora, nada. Porém, segundo o chefe do Dnit em Mato Grosso, Orlando Fanaia Machado, R$ 110 milhões estão depositados na conta do governo estadual, há cinco anos, para a obra.
Fanaia não deu detalhes sobre a dinheirama que hiberna numa conta rechonchuda do governo. Porém, uma fonte política adiantou que se trata de recurso destinado pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2) e que o governador Pedro Taques ou por incompetência, ou por pirraça, ou até mesmo para não retomar obra iniciada fora de seu governo, desconsiderou o montante e a importância do Contorno Norte.
Wilson Santos agora é deputado estadual e até recentemente foi secretário de Cidades do governo Pedro. Wilson Santos tem bens bloqueados por suspeita de improbidade administrativa quando respondia pelas obras do Rodoanel Norte com recursos do governo federal. A construção não avançou e o Rodoanel está paralisado. A sabedoria popular apelidou o Rodoanel de Roubanel. O bloqueio foi determinado pelo juiz federal em Cuiabá Fábio Henrique de Moraes Fiorenza e atinge outros quatro acusados e duas empresas.
Delírio bilionário
Esse elefante branco foi incluído ao pacote de 66 obras do programa “Pró-Estradas Vale do Rio Cuiabá”, lançado por Pedro Taques em 13 de novembro de 2015, para ser executado em 13 municípios. O programa teria R$ 1 bilhão, dinheirama essa do Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab), Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) por meio do programa Pró-Turismo, Banco do Brasil e da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).
O Pró-Estradas Vale do Rio Cuiabá ficou praticamente no papel, apesar da eloquência do discurso de Pedro ao lança-lo numa solenidade à margem da MT-010, na área urbana da capital.
DUPLICIDADE – Elefante branco e Roubanel são apelidos pejorativos nascidos da sabedoria – e da indignação popular -, a obra inacabada tem dois nomes nascidos da generosidade política dos grupos dominantes em Cuiabá. Rodoanel Mário Covas e Rodoanel Jonas Pinheiro.
Eduardo Gomes/blogdoeduardogomes
FOTOS:
1 – JL Siqueira
2 – Arquivo Eduardo Gomes
3 – Arquivo Gabinete de Comunicação do Governo
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