Meu punk da periferia
Estava rodando rumo ao Pedra 90 num domingo pela manhã quando o camarada Brás Rubson me comunicou via WhatsApp que estava indo para o escritório da Kuya Comunicação, no Edifício Mirante do Coxim, a fim de atualizar mídias sociais e que se eu quisesse poderia ir para lá.
Ele não disse, mas ficara subentendido, como é óbvio, que se eu fosse, depois, mais tarde, teríamos almoço e alguma bebida: cerveja ou um vinho da serra chilena ou do Alentejo, de Portugal.
Mas qual! Não obstante o convite tácito, e de promessa boa, tive de recusar. “Estou indo pra periferia, visitar amigos. Punk da periferia”.
Não só as regiões periféricas das grandes cidades de nosso tempo são ‘punk’ nesse sentido – por vezes o centro, enegrecido e cinza, é até bem mais trash –, mas é que nas bordas das zonas metropolitanas o termo alcança uma simbologia difícil de ser superada em significância e sugestão.
É que para mim essas paisagens urbanas (ou suburbanas), ainda mais num domingo de manhã, chegam quase sempre trazendo uma sensação de incerta melancolia, resultante da percepção de abandono, uma vaga desolação, feito uma via férrea construída, e jamais entregue à população, e que envelheceu sem uso.
Mas, independente de curtir a melancolia tal qual meu primo Nilson José (melancolia é a alegria de estar triste), o fato é que curto, muito, bairros tais como o Pedra 90. É que ali, apesar da fama de violento, ainda persiste uma camaradagem nas ruas, nos bares, minimercados, padarias, salões de barbeiro.
Você pode até achar que “eu estou por fora ou que eu estou inventando”, mas é que ali reencontro meu interiorano/suburbano coração, quase tanto quanto na minha terra adotiva (São José dos Quatro Marcos, região oeste de Mato Grosso), para onde sempre volto, ou na terra quase natal (Mesópolis, região oeste de São Paulo), de onde vim na década de 1980 e para onde sinto cada vez menos vontade de voltar.
Talvez seja porque à minha terra eu nunca mais precise voltar, geograficamente, pois que já está para sempre no cérebro e no coração, como disse Drummond em ‘A ilusão do migrante’: “Quando vim da minha terra / se é que vim da minha terra…”.
O interior, a periferia. O eterno retorno. Pra quem nasceu e cresceu no interior, igual a mim, a periferia pode estar em qualquer lugar, pois reside na verdade é dentro da gente mesmo.
MARINALDO CUSTÓDIO é escritor e mestre em Literatura Brasileira pela UFF
mcmarinaldo@hotmail.com
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