Água para irrigação do jeito que Nininho quer

Eduardo Gomes

@andradeeduardogomes

Pego carona no projeto de lei do deputado Nininho (PSD) para insistir numa tecla que bato há bastante tempo: irrigação. A Comissão de Agropecuária, Desenvolvimento Florestal e Agrário e de Regularização Fundiária da Assembleia deu parecer favorável para a criação do Dia da Agricultura Irrigada no Estado. O site que noticiou a proposta do parlamentar esqueceu-se de mencionar a data definida para tanto, mas isso é apenas um detalhe do nosso jornalismo que costuma mostrar o santo e se esquece do milagre.

Dia da Agricultura Irrigada à parte, a iniciativa de Nininho em defesa da irrigação é louvável e essa prática precisa ser incrementada com a utilização de pivôs, gotejamento, aspersão e outros mecanismos para tanto.

Mato Grosso cultiva 180 mil hectares irrigados, mas o potencial irrigável é muito maior do que os números consolidados. Um entidade representativa atuante, a  Associação dos Produtores de Feijão, Trigo e Irrigantes de Mato Grosso (Aprofir) defende a bandeira da irrigação.

A carona é uma forma de contribuir com a meta de Nininho. Há algumas décadas escrevo e denuncio a quebra de compromisso de Furnas com a irrigação em Mato Grosso – e nenhuma autoridade que procurei demonstrou interesse em desatar o nó que narro a seguir: O Aproveitamento Múltiplo de Manso (APM Manso) tinha compromisso de irrigar 50 mil hectares em Cuiabá e região e não o cumpriu.

Lazer no lago de Manso

O APM Manso tinha quatro compromissos com Mato Grosso, mas não os cumpre ao pé da letra. Aquela hidrelétrica mato-grossense deixa de lado duas de suas responsabilidades: a irrigação de 50 mil hectares em Chapada dos Guimarães, Santo Antônio de Leverger e Cuiabá, e o controle da vazão do rio Cuiabá.

Quando da retomada das obras da hidrelétrica do rio Manso, afluente do Cuiabá, 86 quilômetros acima da capital, nos municípios de Chapada dos Guimarães e Nova Brasilândia, no final dos anos 1990, aquele empreendimento era definido como hidrelétrica de Manso, e ganhou novo nome: Aproveitamento Múltiplo de Manso (APM Manso). “Múltiplo” pois além da geração de energia ele teria outros três pilares: a irrigação de 50 mil hectares, principalmente de pequenas áreas inseridas ou não ao programa de reforma agrária; o incremento do turismo; o controle da vazão do rio Cuiabá . Além da mudança da denominação o represamento do rio ganhou novos donos. Até então era da Eletronorte, e passou para Furnas e o consórcio PROMAN, formado pelas empresas Odebrecht, Servix e Pesa. A estatal responde por 70% e o consórcio por 30% do empreendimento.

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Manso começou a ser construído em 1988, mas por falta de recursos, de interesse político e por pressões ambientais, foi paralisado. Para a retomada foi decisiva a participação do então governador Dante de Oliveira, que era ligado ao presidente Fernando Henrique Cardoso, que o inaugurou em 2000. Dante também contou com apoio no Congresso Nacional.

A retomada aconteceu num clima de mudança total. O passado deveria ser sepultado – assim pensava Furnas, que rotineiramente levava jornalistas ao canteiro de obras e detalhava a construção.

Descompromisso

 O APM de Manso contempla dois objetivos que faziam parte de seus compromissos: gerar energia, mas sem nunca alcançar sua capacidade máxima de 210 MW. E abrir portas ao turismo no entorno e no lago com 42.700 hectares de lâmina d’água – 98% em Chapada e 2% em Nova Brasilândia. A estrutura hoteleira, as marinas e a utilização da área para lazer respondem por esse compromisso, que funciona bem.

A parte negativa de Furnas fica por conta da falta da irrigação prometida e o controle da vazão do rio Cuiabá.

Quando de estiagem prolongada, o que provoca drástica redução do nível do rio Cuiabá, são acesas todas as luzes de advertência. De modo geral o índice hidrológico do rio é considerado ‘crítico’” por especialistas e preocupa autoridades, pois a diminuição da água agrava ainda mais a questão ambiental por conta do esgoto in natura lançado no rio por Cuiabá e Várzea Grande. Furnas tem compromisso de assegurar razoável vazão, para evitar essa situação, mas sistematicamente não o faz. A assessoria de Furnas não respondeu mensagens com questionamentos a esse respeito que fiz em várias oportunidade.

A irrigação dos 50 mil hectares saiu de cena no dia em que o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, acionou a primeira turbina do empreendimento. Nenhum político cobra esse compromisso e não se sabe sequer se o mesmo consta em documento.

NININHO –  O deputado Nininho em nome de sua sugestão para a irrigação, deveria questionar Furnas e o Proman sobre o compromisso de irrigar 50 mil hectares em Cuiabá e adjacências.

Caso Mato Grosso consiga fazer o APM Manso cumprir seu compromisso, o ganho – ainda que tardio – em produção e produtividade agrícola e os dividendos sociais para a agricultura familiar, comunidades tradicionais, assentamentos e áreas  de médio e grande porte serão extraordinários.