Quem de direito foi o maior proprietário de áreas rurais em Mato Grosso antes da divisão territorial que criou Mato Grosso do Sul em 1977. À época o mosaico fundiário era nebuloso, o que levava cartórios a registrarem escrituras de terrenos localizando-os em parte por sua estranha vizinhança, o famoso quem de direito. Essa fase foi minimizada, mas ainda não passou. Houve avanço na segurança jurídica dos imóveis com a cristalização das posses, o fechamento de cadeias dominiais e a incorporação do georreferenciamento. Mesmo assim, ainda há milhares de áreas, inclusive residenciais, sem titulação.
Nenhum governo demonstrou interesse em atacar o problema solucionando-o. Para que tal acontecesse seria preciso a formação de uma frente fundiária composta pelo Incra, Instituto de Terras de Mato Grosso (Intermat), Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Ibama e Funai. Caso essas instituições trabalhassem em sintonia, cruzando dados e informações, seria possível, em pouco tempo, dar nova configuração jurídica à base territorial rural e urbana. Longe dessa sugerida frente, poucos avanços acontecerão e continuará reinando o quadro de instabilidade para ocupantes de áreas sem título definitivo.
Em muitas cidades, principalmente naquelas que surgiram em áreas de invasão rural ou ocupação garimpeira, a exemplo de Vale de São Domingos, Confresa, Paranatinga, Nova Nazaré, Alto Boa Vista, Ribeirão Cascalheira, Nova Brasilândia, Nova Guarita, Rondolândia e Canabrava do Norte, o mosaico fundiário urbano é um verdadeiro labirinto que ninguém sabe onde vai desaguar.
Cuiabá, capital quase tricentenária, tem 281 mil imóveis urbanos sendo 226 mil prediais e 55 mil terrenos vazios. Entre eles, há milhares que não têm titulação. Até mesmo a prefeitura tem dificuldade para apontar o número exato da pendência, porque existem muitos que sequer constam da lista oficial. Moradores de bairros resultantes dos grilos nos anos 1980 e na década de 1990 enfrentam o problema da falta de documentação de suas posses; situação semelhante acontece com ex-mutuários da extinta Cohab, que mesmo após quitarem suas casas não receberam a escritura das mesmas, porque o terreno onde foram construídas não tem registro cartorial.
Em Várzea Grande, a maior cidade de Mato Grosso depois de Cuiabá, a situação fundiária é caótica com 60% de seus imóveis sem documentação, o que afeta aproximadamente 45 mil famílias, que representam 180 mil dos seus 274.013 moradores. A prefeita Lucimar Campos (DEM) lançou uma campanha em parceria com a Defensoria Pública Estadual na tentativa de solucionar o problema.
O atípico mosaico fundiário mato-grossense não exclui os projetos de assentamentos rurais do Incra e Intermat. Existem 700 assentamentos – em números redondos – e nenhum conseguiu a emancipação plena por algumas razões e dentre elas a balbúrdia documental.
Mato Grosso não tem motivos para comemorar a condição de seu mosaico fundiário. Ao contrário, há razões de sobra para se preocupar com ele. O governo deve, imediatamente, buscar sua regularização e, com ela, dar a segurança jurídica que tanta falta faz e que tem causado desentendimento entre vizinhos, acirrado a luta pela terra e, provocado mortes no campo. Chega dessa vergonha fundiária.
Eduardo Gomes de Andrade
Editor
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