Uma sopa de siglas: PLC, LRFE, CFP, DTROLT, ROLT, UFP, ICMS, FETHAB e RGA. Misturadas aos textos – e até para confundir o leitor – essas siglas formam o grande espelho do recém-empossado governo de coalizão do democrata Mauro Mendes. Contribuintes e servidores batem cabeça sem saber o que fazer. A Assembleia Legislativa, sempre de joelhos aos governadores, se prepara para sacramentar a reforma proposta que é apresentada enquanto tábua da salvação para restaurar o equilíbrio fiscal que o governador anterior, Pedro Taques, fez com apoio do mesmo Mauro, e da dócil bancada na Assembleia.
Contribuintes tentam se proteger junto às suas entidades de classe, mas boa parte delas faz o jogo do governo – sempre fez. Por enquanto, a única voz que se levantou com firmeza foi a de Antônio Galvan, que preside a Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja).
Servidores isoladamente nada podem fazer. Quem em tese os defende é o Fórum Sindical, que congrega 32 sindicatos das diversas áreas do governo. Salvo um ou outro sindicalista, os componentes do Fórum não gozam de bom trânsito perante a opinião pública: em sua maioria são adeptos do continuismo, quase sempre fazem concessões ao Palácio Paiaguás e não adotam discurso com alcance além do círculo sindical.
Com um forte discurso – bem amparado pela mídia – Mauro pede o fechamento de empresas do governo, anuncia demissão de milhares – mas não extingue cargos -, enxuga secretarias. Parcela o 13º salário, escalona a folha salarial. Sugere a redução de duodécimo. Descamba para a área das siglas.
O terreno é fértil para Mauro semear suas siglas, que em respeito ao leitor sequer devem ser esmiuçadas no todo, mas para efeito didático eis o que significa algumas delas:
CFP – É ai que mora o perigo. Essa sigla significa Capacidade Financeira de Pagamento e deixa o servidor no meio de uma briga de foices no escuro. Se o governo de Mauro transcorre no verde, paga a RGA, que é a revisão geral anual, que costumamos chamar de gatilho salarial. Esse gatilho é disparado automaticamente para recompor a capacidade de compra do salário. Em Mato Grosso, por iniciativa de Mauro – e seguramente com a aprovação da Assembleia – isso não existirá mais. Se Mauro disser que tem lastro, paga; em caso contrário. banana para o servidor.
Mauro justifica que ao encostar o servidor na parede com a CFP o faz em nome de outra sigla, a LRFE, a Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual, que chove no molhado sobre a LRF, que está em pleno vigor no país chamado Brasil, ao qual Mato Grosso integra enquanto ente federativo.
UPF – Por extenso é Unidade Padrão Fiscal, que é a base para taxar quem produz. Quanto a essa sigla curtinha não há muito traquejo político por parte de Mauro, para aplicá-la sobre a pluma do algodão, já que é ela quem regula o desembolso tributário do cotonicultor. Em cascata, nessa área, acontecerá aumento de alíquotas sobre commodities etc.
Os incentivos fiscais também serão revirados ao avesso. O facão será impiedoso com os industriais que investem em Mato Grosso. Essa é uma área que Mauro conhece muito bem. Seu grupo Bimetal, segundo Taques – que o antecedeu – foi beneficiado com renúncia fiscal (o famoso incentivo) milionária. Quanto a esse segmento é preciso esperar para ver o que acontecerá com os que geram emprego e produzem, e o que o governador dirá sobre os incentivos que seu grupo recebeu: será que em razão da recuperação judicial, que levou milhares de funcionários da Bimetal para a rua da amargura, Mauro devolverá os incentivos que recebeu? Será que a devolução terá correção? Ou será que o plano para reequilibrar as finanças públicas não contará com tal gesto do governador, que fala em demissão, taxação e outras medidas amargas?
Sem prejudicar ou embaralhar a leitura deste texto, e ao seu término, o extenso de suas siglas: Despesas Totais custeadas com a Receita Ordinária Líquida do Tesouro (DTROLT) e Receita Ordinária Líquida do Tesouro (ROLT).
Quem votou em Mauro sabia que ele encontraria o governo na bancarrota. Também sabia que ele – Mauro – e parte dos seus atuais assessores contribuíram para o caos instalado na administração Taques. Foi uma aposta perigosa e o eleitor perdeu. Resta agora engolir a sopa de siglas e esperar quatro anos por sua digestão.
Eduardo Gomes de Andrade – editor de blogdoeduardogomes
FOTO: Mayke Toscano em 10 de janeiro de 2018
Enquanto isso, a falta de transparência é total. Nada de publicidade da receita do Estado para 2019. Nada de Mira Cidadão e os números da CGE. Nada da SEFAZ permitir a devida auditoria externa dos dados da Renúncia Fiscal. Nada do TCE, da AL, do TJMT e do MPE-MT abrirem mão de seus privilégios em nome da governabilidade. Se o cidadão de bem analisar as LOAs de 2015 a 2016, vai ver que os poderes tiveram aumento de repasse de até 30% acima da inflação do período.