De alegria e dor

Hospital e Pronto Socorro Municipal Milton Pessoa Morbeck, em Barra do Garças. Essa unidade hospitalar é referência para atendimento de pacientes com covid-19 na Barra e adjacências mato-grossenses e goianas. Sua estrutura para tanto se resume em nove leitos de unidades de terapia intensiva (UTIs), instaladas após o começo da pandemia, que tem ceifado vidas tanto nas cidades quanto na zona rural e áreas indígenas naquela região. O governo estadual instalou quatro UTIs, e a prefeitura, cinco.

A realidade na Barra é bom espelho do que acontece em Mato Grosso, onde nem mesmo a pandemia conseguiu sensibilizar o governador democrata Mauro Mendes, a Assembleia Legislativa, prefeitos e vereadores para a necessidade de investimento em Saúde Pública.

De Alto Taquari a Pontal do Araguaia, pela MT-100, cruzando Alto Araguaia, Araguainha, Ponte Branca, Ribeirãozinho e Torixoréu não há uma UTI sequer. O trajeto é de 315 quilômetros.  Em Mato Grosso Saúde Pública também pode ser chamada de utopia.

Ao longo do tempo a Saúde Pública foi mantida sob o tapete e nem mesmo a pandemia mudou esse perverso costume. O Estado em sua amplitude permaneceu perdulário, formado por ilhas ordenadoras de despesa em seus poderes. Nenhum político, magistrado uo membro do Ministério Público abriu mão no todo ou em parte de seus direitos no campo salarial e de suas vantagens. Não somente por isso, mas também por essa razão não há disponibilidade de recursos para o setor ora estrangulado pela demanda de pacientes vítimas de covid-19.

Pouco se fez institucionalmente pela Saúde Pública. Produtores rurais e entidades que os representam doaram recursos para melhorar e ampliar o atendimento em Diamantino, Primavera do Leste, Rondonópolis, Água Boa etc. Em meio a essa tragédia, enquanto figuras fora do chamado Poder Público estendiam as mãos, políticos metiam a mão. Os escândalos nas secretarias de Saúde em Cuiabá e Rondonópolis foram providencialmente abafados.

Também em meio à pandemia não faltou espaço para discursos de fechada também chamados de jogar para a torcida. O médico sanitarista do governo estadual e deputado estadual petista Lúdio Cabral ajuizou ação na Justiça Federal contra a aplicação das provas do Enem que aconteceram no domingo, 17 deste mês. No entanto, o mesmo Lúdio foi incapaz de se licenciar do mandato parlamentar para atuar na linha de frente, na condição de profissional da saúde.

Mato Grosso é governista ao extremo. Nos grupos sociais do Facebook e WhatsApp não faltam vozes raivosas atacando o presidente Jair Bolsonaro e o governador de São Paulo, João Doria por conta da pandemia. De igual modo são muitos os que os defendem. No entanto, não se ouve praticamente nada criticando Mauro Mendes por sua omissão. Há muito fogo verbal fora de nossas divisas, mas internamente reina o silêncio cúmplice e subserviente – salvo uma ou outra exceção.

A vacina ensaia seus primeiros passos para aplicação da primeira dose em grupos prioritários, mas muito longe ainda de sua universalização. A real cobertura vacinal somente acontecerá após a segunda dose sobre a população de 3,5 milhões de habitantes.

Não temos cobertura vacinal ainda. Paralelamente a pandemia avança e o número de óbitos se aproxima de cinco mil, com quase 200 mil infectados, dos quais 8,1 mil se encontram em isolamento domiciliar e cerca de 650 estão internados em leitos de enfermarias e UTIs. A taxa de ocupação dos leitos na rede pública alcança 70%. O amanhã é uma incerteza pela incapacidade de resposta da Saúde Pública.

Um dia, com a bênção de Deus, a pandemia nos deixará –  será triste lembrança de um período sombrio. Mesmo assim a população continuará precisando de atendimento médico, hospitalar e laboratorial em Mato Grosso, onde cirurgia cardíaca é privilégio de poucas cidades, onde a hanseníase é hiperendêmica, onde malária e leishmaniose continuam fazendo vítimas, onde o diabetes, hipertensão, doenças renais e respiratórias crônicas, hipotiroidismo, problemas gastrointestinais, fraturas e tantos outros males continuarão vitimando nossa gente diante da insensibilidade dos donos do poder aferrados em seus direitos, felizes com suas vantagens.

De um lado a alegria da benesse e de outro a dor do povo que padece.

Eduardo Gomes é editor de blogdoeduardogomes

eduardogomes.ega@gmail.com

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Comentários (1)
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  • Inácio Roberto Luft

    ótima reflexão, como sempre