Na Polícia Federal

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Semana de um jogo de grande importância do Mixto contra o Dom Bosco pelo Campeonato Mato-grossense de Futebol. Às vésperas do coletivo-apronto do alvinegro, que treinava no campo do Hospital Psiquiátrico Adauto Botelho, no Coxipó da Ponte, o dirigente Lino Miranda havia concedido uma entrevista a um jornal da cidade esculhambando algumas cabeças coroadas da diretoria mixtense.

Afirmou Lino Miranda na matéria que enquanto estivessem no comando do Mixto pessoas como Henrique Gori, Lourival Fontes, Waldemir Olavarria, Nilo Ponce, entre outros, o clube não ia pra frente. Lino Miranda defendia um Mixto forte, competitivo, integrado por jogadores de alto nível técnico. E com aquele plantel que o clube havia montado para a temporada, decididamente, o alvinegro não ia a lugar algum – achava Lino Miranda.

Coincidentemente, o lateral esquerdo Coronel, do Vasco da Gama, havia mandado para fazer testes no Mixto vários jogadores, entre eles Lenílson, Luiz Augusto e Pastoril, que, por sinal, não estavam agradando. Lenilson, por exemplo, arrebentava nos treinos, mas nos amistosos para testar o grupo, que droga!…

Lino Miranda tinha ido ao coletivo para confirmar se o zagueiro Jorge Macedo estava ou não com três cartões amarelos. Se estivesse, nem ia treinar no time titular…

A entrevista de Lino Miranda havia irritado particularmente duas pessoas: o presidente Lourival Fontes e seu homem forte na diretoria Henrique Gori. Os dois tinham lá suas razões para estar de bronca com Lino Miranda.

Fontes ficou preocupado com a possibilidade da bombástica entrevista de Lino Miranda chegar aos ouvidos do presidente do Vasco da Gama, Agartino Gomes, de quem ele era muito amigo e abalar a amizade entre ambos. Para cultivar a amizade, Fontes inclusive mandava de vez em quando uns robustos pacus frescos para Agartino para agradar o amigo.

O problema de Gori era bem diferente: ele era o gerente em Cuiabá do Banco Comércio e Indústria do Estado de São Paulo S/A e se a reportagem de Lino Miranda chegasse ao conhecimento da matriz do banco em Ribeirão Preto-SP, sua cabeça certamente rolaria…

Danado como era, Lino Miranda espalhou na roda em que estava no campo do Adauto Botelho que sua explosiva entrevista ao jornal tinha sido enviada, por via aérea, para Agartino Gomes e também para a diretoria do banco de Gori.

Quando ouviu a declaração de Lino Miranda, o radialista Jair Figueiredo nem esperou começar o treino e se mandou para o banco para contar a Henrique Gori o que tinha ouvido da boca do dirigente mixtense. Que se danasse a cobertura do coletivo alvinegro.

Como era praxe na época, depois dos treinos do Mixto, técnico, massagista, roupeiro e eventualmente algum diretor se dirigiam para o banco de Gori para lhe repassar as novidades. Ou falar dos problemas surgidos no coletivo…

No fim da tarde daquele dia, o banco de Gori parecia mais a sede do Mixto em dia de reunião da diretoria. Era aquele monte de gente falando, gesticulando – enfim, um ambiente muito tenso em torno da mesa de Gori.

– O que o Agartino vai pensar de mim depois dessa notícia no jornal? Que molecagem do Lino! – esbravejava Fontes…

Gori era o mais agitado de todos. De vez em quando, ele sacava sua Carteira de Trabalho de uma gaveta de sua mesa, brandia no ar e repetia com raiva: “Tá aqui… óh! Eu sou registrado! Podem me demitir, seus filhos da puta…”

A confusão acabou parando na Polícia Federal, que funcionava na esquina das ruas Campo Grande e Pedro Celestino, bem perto da agência do banco em que Gori trabalhava. Mas o rolo acabou bem, com Lino Miranda explicando ao delegado que tudo não passava de uma brincadeirinha…

Na verdade, Lino Miranda não tinha enviado a entrevista do jornal para ninguém, pois o que ele queria mesmo era ver o circo pegar fogo. E como pegou!…

PS – Reproduzido do livro Casos de todos os tempos Folclore do futebol de Mato Grosso, do jornalista e professor de Educação Física Nelson Severino