Em 1969, Santos e América, do Rio de Janeiro, campeão carioca, vieram a Cuiabá disputar, ainda no Dutrinha, um quadrangular com o Mixto e o Dom Bosco para comemorar os 250 anos da capital mato¬-grossense. A família do cuiabano Almiro, que estava jogando no Santos, decidiu prestar uma homenagem aos santistas, oferecendo-lhes um churrasco bem cuiabano, regado a cerveja, evidentemente.
Alguns jogadores do Santos – Lima, Clodoaldo, Negreiros, Abel, Mané Maria e Geraldino – compareceram à casa da família de Almiro, na Rua Joaquim Murtinho, para jantar com outros convidados. Pelé e Almiro não foram: os dois estavam contundidos e nem tinham vindo a Cuiabá.
Depois do jantar, papo rolando animado, Pelezinho, irmão de Almiro e uma das “feras” do Mixto, comentou numa roda de boleiros que o seu mano famoso havia lhe dito que no Santos só havia o “rei“… os outros eram tudo japonês. Quer dizer, com aqueles olhos pequeninos dos orientais, eram ruins de bola!…
Veio a rodada final, dia 8, com o Dom Bosco pegando o América e o Mixto enfrentando o Santos. No dia do jogo com o Santos, o lateral esquerdo Darci Avelino, que tinha presenciado o show de bola que Mané Maria tinha dado em Elói, amanheceu adoentado…
Pelezinho, o substituto de Darci Avelino, sacou o lance: seu companheiro não estava doente porra nenhuma. Simplesmente ele não queria enfrentar Mané Maria. Pelezinho bateu o pé: não jogaria também e fim de papo.
Pior para Severino, que foi escalado para jogar na lateral esquerda. Ele fez uma marcação tão dura no ponteiro direito santista para não repetir o vexame de Elói, que quando retornou a Santos, o ponteiro direito comentou com Almiro: “Nunca mais vou jogar em sua terra, porque lá tem um jogador que corre atrás da gente até no mato…” – referindo-se a Severino, que não descolava de Mané Maria nem quando ele saía de campo para pegar a bola para cobrar um lateral ou escanteio. O Dom Bosco perdeu de 3×1 para o América e o Mixto levou de 5×1 do Santos.
Pouco tempo depois do Santos ter participado do quadrangular em Cuiabá, Almiro estava no Paulista, de Jundiaí. Especula-se até hoje que sua saída do alvinegro teve tudo a ver com o comentário feito em Cuiabá por Pelezinho sobre a japonesada do Santos…
Velho amigo de Almiro, Lito garante que não foi nada disso. O que aconteceu foi que Almiro entendeu que enquanto Pelé estivesse no Santos, ele não teria nenhuma chance de se firmar como titular do alvinegro. Só por isso – e estava carregado de razão – Almiro pegou o boné e caiu fora do Santos.
Embora tenha ficado um bom tempo no Santos, exceto em casos de contusões de Pelé, Almiro só entrava no time no decorrer de jogos quando o “rei” impunha sua escalação. E como impunha!
Nas excursões do Santos pelo exterior, Almiro sempre era incorporado à delegação por interferência de Pelé. Acontece que Almiro fala inglês, francês, espanhol, além do português, claro, e muitas vezes livrou o “rei” do assédio de fãs nas ruas por onde o alvinegro passava pelo mundo afora, fazendo seus admiradores acreditarem que Pelé era outros jogadores negros do Santos, principalmente Coutinho e Dorval…
PS – Reproduzido do livro Casos de todos os tempos Folclore do futebol de Mato Grosso, do jornalista e professor de Educação Física Nelson Severino