Jayme é quase um poli pré-candidato: é citado enquanto provável candidato ao Senado ou ao governo e ainda a vice-governador numa eventual chapa encabeçada pelo governador tucano Pedro Taques. Habilidoso, desconversa sobre candidatura, mas insiste que seu partido “tem musculatura” para todos os cargos.
Jayme assumiu o governo em 1991 e permaneceu no cargo até o final de 1994. Sua administração é bem avaliada inclusive por adversários e ele não contava com fontes de recursos iguais a algumas de agora, como é o caso do Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab).
Relacionado entre os caciques políticos mato-grossenses, por conta de pertencer ao grupo etário da terceira idade, Jayme sempre demonstra calma, ouve com atenção e fala pouco. Porém, não costuma levar desafora para casa – como se diz.
Jayme foi personagem de um capítulo do livro “Dois dedos de prosa em silêncio – pra rir, refletir e arguir” publicado em 2015 pelo jornalista Eduardo Gomes de Andrade (sem apoio das leis de incentivos culturais), com ilustração de Generino Rocha e capa de Édson Xavier.
O capítulo tem o título e o texto abaixo:
Pedra 90 é também o Número 1
Feltrin não teve tempo pra administrar e apesar do mandato manga curta comeu o pão que o diabo amassou com o rabo, porque Bezerra deixou o governo atolado em dívidas, salários e fornecedores atrasados e com descontentamento generalizado por parte dos servidores. Caos era o melhor rótulo para o Palácio Paiaguás.
Aproveitando o cenário o PT e seu braço sindical na educação, o Sintep, prepararam uma manifestação monstro pra sexta-feira, 15 de março de 1991, data da posse de Pedra 90 e seu vice petebista Osvaldo Sobrinho. O plano era cercar o palanque montado para as autoridades, manter gritos de ordem e jogar uma chuva tomates e ovos nos novos donos do poder.
Quem causou o estrago no governo foi o PMDB, mas na visão do PT, o PFL e os peemedebistas eram adversários em comum, farinha do mesmo saco e juntos precisavam ser combatidos com a mesma intensidade.
A Casa Militar do governo avisou Feltrin sobre a manifestação planejada para o dia da posse e ele procurou Pedra 90 pra que juntos encontrassem uma saída. Conciliador o governador constitucional propôs a realização do ato sem participação popular. Seu sucessor não gostou da ideia e a jogou pra escanteio: “Vamos fazer festa com a presença do povão, Moisés, mas você manda o pessoal da Casa Militar conversar comigo”, ordenou o homem que em breve seria o dono do poder.
No dia 12 de março a conversa de Pedra 90 com os oficiais da Casa Militar foi curta. O governador a um passo do poder fez prevalecer sua condição de comandante em chefe da Polícia Militar. Juntos, armaram o circo pra posse.
Cuiabá, manhã de 15 de março de 1991. A multidão cerca o palanque onde Pedra 90 faria o primeiro pronunciamento no cargo. Professores indignados e sindicalistas do Sintep com suas camisetas temáticas não conseguiam mais se conter. Todos queriam ver Jayme despontar na curva após passar a tropa em revista. A meta era uma vaia sem precedentes e um banho de ovos e tomates.
Misturados aos professores e sindicalistas, jovens musculosos prestavam atenção a tudo. Notar que havia algo estranho alguns manifestantes notaram, porque espremidos entre eles havia um mar de músculos e de cabelos cortados rentes ao estilo militar. Só que não havia mais tempo pra tentar passar a situação a limpo.
Poucos minutos antes da entrada triunfal de Jayme um sinal imperceptível aos manifestantes acendeu o estopim que transformaria aquele local em praça de guerra. Um dos jovens musculosos se desentendeu com outro de igual porte físico. Empurrões para lá e pra cá. O caldo entornou. Murros, tapas, golpes de capoeira, pancadaria pesada de fazer inveja ao UFC. A multidão apanhava sem entender o que estava acontecendo.
Alguns minutos depois havia muita gente zonza com os sopapos, não faltavam dentes com suas respectivas raízes pelo chão pontilhado de manchas vermelhas. Num cenário de devastação se via tiaras, brincos, sapatos, chinelos, chapéus e bonés caídos no entorno do palanque.
Quando Jayme chegou radiante, a paz reinava entre os que esperavam para o beija-mão e a deferência devida ao rei. Nenhuma voz de protesto se ouvia. Feltrin não foi informado com antecedência sobre o sururu; ficou sabendo na hora. “Pelo jeito os manifestantes preferiram brigar entre si, né Moisés?”, provocou Pedra 90. O governador constitucional que deixava o cargo sorriu sem graça.
Num discurso inflamado Pedra 90 falou que seu governo respeitaria a oposição e as manifestações. Ao término agradeceu a um sem-número de pessoas. Claro que ele não fez nenhuma citação aos jovens musculosos que bem distante dali comemoravam o cumprimento da primeira missão recebida do novo Número 1.
Eduardo Gomes/blogdoeduardogomes
FOTO: JL Siqueira
ILUSTRAÇÃO: Generino
SÉRIE
TRANSPARÊNCIA postou 10 capítulos. Os nove anteriores podem ser acessados em:
1 – PPP Caipira nasce da ousadia de Pivetta
2 – Suplente de última hora chega ao Senado
3 – Riva mesmo caido derrota Taques
4 – Páginas da vida
5 – Leitão, o único preso entre os pré-candidatos ao Senado e governo
6 – Carona na Arca de Noé
7 – O dedo de Kassab
8 – Taques e o cadeado na hidrovia
9 – Escândalos tomam discurso moralista de Pedro Taques