SÉRIE (V) – Medeiros não por Mato Grosso, mas por Bolsonaro

 

José Antônio dos Santos Medeiros tem 50 anos e carrega no currículo os diplomas de graduação em Matemática pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), e de bacharel em Direito pelo Centro de Ensino Superior de Rondonópolis (Cesur), além do distintivo e da farda de policial rodoviário federal, que é sua profissão e da qual se aposentou precocemente aos 49 anos. Frio, calculista, Medeiros não hesita em trair companheiros quando seus interesses e planos estão em jogo: foi assim com Percival Muniz, em 2016, na disputa pela prefeitura de Rondonópolis. Candidato ao Senado na eleição suplementar de 15 de novembro, sua bandeira não é Mato Grosso, mas sim o presidente Jair Bolsonaro. 

Medeiros é deputado federal pelo Podemos, com 82.528 votos, a segunda maior votação ao cargo no ano de 2018, em Mato Grosso, e sonha acordado 25 horas por dia com a cadeira de sua correligionária Selma Arruda, que em 10 de dezembro de 2019 foi cassada por 6 a 1 pelo Tribunal Superior Eleitoral pelos crimes de caixa 2 e abuso de poder econômico. Com Selma Arruda, também foram degolados seus suplentes Beto Possamai e Clerie Fabiana, ambos eleitos pelo PSl, pelo qual Selma Arruda também se elegeu. Tanto a senadora quando Possamai tiveram os direitos políticos suspensos por oito anos.
Mesmo recebendo altos salários e gozando de vantagens dos cargos há mais de cinco anos, Medeiros ao requerer o registro de sua candidatura ao Senado sustentou que não tem patrimônio e que a soma de seus bens é exatamente R$ 260.948,03.

 

PPS um partido forte

 

José Medeiros

No começo dos anos 2000 Medeiros militava em Rondonópolis num grupo que era liderado por Percival Muniz. Fazia parte de uma ala jovem que sonhava em ocupar espaço político em Mato Grosso em nome de um socialismo moreno ou de mesa de bar, mas sem consistência ideológica.

Percival, o líder do grupo, assumira a prefeitura em 1998, com a renúncia do titular Alberto de Carvalho (PMDB) num rocambolesco episódio que se tornou conhecido como Semanada – pagamento de propina ao prefeito pela empresa TCR que em monopólio explorava o transporte coletivo urbano. Em 1996 Alberto foi eleito prefeito e Percival (PDT), seu vice.

Em 2002 Blairo Maggi  (PPS) morava em Rondonópolis se elegeu governador com apoio de Percival. Dois anos depois o mandato de Percival terminaria e Blairo tratou de indicar Adilton Sachetti, do mesmo partido, para prefeito. Adilton venceu, e mesmo sendo afilhado de seu compadre Blairo e abençoado por Percival, sua eleição foi muito apertada: Adilton recebeu 30.932 votos. O então deputado federal Wellington Fagundes (PL), 27.931. Zé Carlos do Pátio (PMDB), 26.133. E o candidato do PDT, Carlos Ihamber, 1.151.

Prestando contas a Taques nos velhos e bons tempos

Integrante do grupo de Percival, Medeiros suou a camisa na eleição de Adilton. Em 2006, com o PPS bufando de tanto poder em Rondonópolis, Blairo saiu à reeleição e Percival para deputado estadual. O líder Percival indicou seu protegido Medeiros para deputado federal e ele cravou 8.175 votos. Não se tratava de candidatura à Câmara, mas somente para somar votos pra legenda, como se fosse uma espécie de escada.

Na eleição em 2006 o campeão de votos para a Câmara foi Carlos Abicalil (PT) com 128.851 votos, e o lanterna entre os eleitos, Valtenir Pereira (PSB), com 52.401. Dos nomes de Rondonópolis para deputado federal o mais votado foi Wellington (PL) com 78.215. Naquele pleito o PPS elegeu Homero Pereira para a Câmara com 100.114 votos.

O resultado em 2006 não esmoreceu Medeiros, que continuou ao lado de Percival em suas folgas na escala de serviço na Polícia Rodoviária Federal.

Em 2010 o PPS integrava uma gigantesca coligação encabeçada pelo PDT do ex-procurador da República Pedro Taques, para o Senado, e Mauro Mendes (PSB) ao governo com Otaviano Pivetta (PDT), de vice. Integrava, mas da boca pra fora, porque não havia nenhum nome do PPS, que era o novo partido de Percival disputando cargo majoritário nem suas suplências.

Taques montou sua chapa ao Senado com o primeiro suplente Zeca Viana (PDT) e Paulo Fiúza (PV); Viana de Primavera do Leste, e Fiúza, de Sinop. Viana não acredita na vitória de Taques e o via enquanto azarão. Daí, tirou o time de campo: trocou a incerteza da suplência por uma candidatura viável a deputado estadual – se elegeu. O azarão, também.

 

Cassado, mas nem tanto

 

No final de 2014 Taques renunciou ao Senado para assumir o governo no começo do ano seguinte, pois foi eleito em primeiro turno com o vice-governador Carlos Fávaro (PP). Medeiros virou senador.

A suplência seria de Adria Muniz

A trajetória de Medeiros ao Senado foi interessante. Seu padrinho Percival era pressionado por parentes e amigos mais próximos pra que indicasse sua irmã, a empresária Adria Muniz (PPS) para chapa de Taques. O nome ocupou espaço na mídia, mas ele ponderou que não soaria bem sendo deputado estadual candidato à reeleição lançá-la para a suplência da chapa ao Senado, e além disso, admirava Medeiros e o via enquanto bom quadro – é assim que os políticos se referem às pessoas – para renovação política.

Adria foi jogada pra escanteio.  Medeiros virou suplente na chapa de Taques. Tanto na suplência quanto nos quatro anos no exercício do cargo Medeiros enfrentou uma ação movida por Paulo Fiúza, que reivindicava a inversão das suplências, mas a Justiça Eleitoral manteve a tramitação em banho-maria, e somente em 31 de julho  de 2018 o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) cassou seu mandato e o tornou inelegível por oito anos, por decisão unânime, mas 13 dias depois uma liminar do ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Napoleão Nunes Maia suspendeu a decisão do TRE e o caso voltou a hibernar.

ATA – A ata da convenção do azarão foi fraudada e mudou a ordem das suplências acordada após a saída de Viana. Paulo Fiúza que seria primeiro suplente foi deslocado para a segunda invertendo a posição com Medeiros.

 

Medeiros trai Percival

 

Em 2016 Medeiros era senador e Percival tentava a reeleição para prefeito, uma vez que fora eleito em 2012. Medeiros desconsiderou o que seu protetor fez para ele em 2010.

Pra trair Percival, Medeiros se desfiliou do PPS em 22 de março de 2016 migrando para o PSD que era a sigla controlada por Carlos Fávaro, que sucedera o mandachuva José Riva no comando daquele partido. Sem filiação ao PPS, Medeiros se sentiu à vontade para abraçar a candidatura de Rogério Salles (PSDB), que concorria contra Percival.  Zé Carlos do Pátio (SD) venceu a eleição por pequena margem sobre Percival e Rogério.

O Senado é meu

 

PRESIDENTE – Medeiros tentou presidir o Senado. Isso mesmo! Em 19 de janeiro de 2017, na eleição para a presidência ele disputou o cargo com Eunicío Oliveira (PMDB/CE) perdendo por 61 a 10 com 10 votos em branco.

No Senado ficou no baixo clero. Não apresentou um projeto sequer de relevância nacional. Caracterizado por destempero verbal contra a esquerda, Medeiros não conseguiu defender os interesses de Mato Grosso.

Dr. Ulysses e Bolsonaro elegendo postes

 

Dr. Ulysses elegia postes

Sites criticavam Medeiros ao longo de seu mandato manga curta no Senado, chamando-o de Senador Sem Voto.

Medeiros viu que não teria chance de vencer a disputa para novo mandato e concorreu para deputado federal com um discurso que bem reproduzia sua linha parlamentar no Senado, de extrema direita.

Na eleição em 2018, Jair Bolsonaro repetiu em Mato Grosso o que fazia o MDB do Dr. Ulysses Guimarães, nos grandes centros, nos anos 1970 – elegia postes. Tanto assim, que elegeu Selma Arruda, o deputado federal Nelson Barbudo (PSL), os deputados estaduais Delegado Claudinei e Sílvio Fávero (ambos PSL) e Medeiros.

 

Entrou para sair; sai para entrar

( Ou turismo bicameral)

 

Medeiros é um bumerangue nos dois sentidos. Na carona de Taques numa chapa fraudada, segundo o TRE, chegou ao Senado, que trocou pela Câmara, e agora quer voltar ao antigo cargo.

Caso o TSE condene Medeiros na ação que hiberna, ele perderá os direitos políticos por oito anos, e na Câmara será substituído por suplente, pegará a estrada e voltará para Rondonópolis. Mas, se eleito senador e condenado, Mato Grosso mergulhará em mais um vexame no Senado, pela dupla cassação de dois senadores no cumprimento de um só mandato: Selma e Medeiros. Isso, sem falar no custo da realização de eleição suplementar.

Se o TSE mantiver a condenação de Medeiros, ele será substituído pela primeira suplente de sua coligação, Gisela Simona (PROS – 50.682 votos), mas Gisela disputa a prefeitura de Cuiabá e caso vença a eleição a suplência passa a ser e ex-senadora Serys Slhessarenko ( PRB – 33.546 votos). Porém,  a suplência de Medeiros  não fica cristalizada em razão da eleição em 15 de novembro, pois o deputado federal Emanuel  Pinheiro Neto, o Emanuelzinho (PTB) é candidato a prefeito de Várzea Grande e, se eleito, numa conjugação de fatores, incluindo a cassação de Medeiros e a vitória de Gisela para prefeita, a vaga de Medeiros poderá cair no colo de Ezequiel Fonseca (PP – 32.410 votos) – para aguçar a memória: Ezequiel é aquele ex-deputado estadual que foi filmado recebendo pacoteira de dinheiro de Sílvio Corrêa, à época chefe de gabinete do então governador Silval Barbosa. Em delação premiada ao Ministério Público Federal homologada pelo Supremo Tribunal Federal tanto Silval quanto Sílvio declararam que a dinheiram era pagamento de mensalinho

Que Mato Grosso entenda: primeiro Bolsonaro

Na Câmara, até agora, a exemplo de seus quatro anos no Senado, Medeiros não apresentou nenhum projeto relevante, e mesmo se identificando como carne e unha com o presidente Jair Bolsonaro, que o nomeou para ser um dos vice-líderes do governo, não conseguiu canalizar recursos nem projetos estatégicos para Mato Grosso que o acolheu ainda criança quando trocou o Rio Grande do Norte pela Terra de Rondon.

Mesmo fazendo de seu mandato uma ferramenta a serviço de Bolsonaro, Medeiros não conseguiu sensibilizar o presidente para liberar a injustificada retenção do Auxílio Financeiro para Fomento às Exportações (FEX), que é a compensação parcial por conta da desoneração do ICMS pela Lei Kandir, para as commodities mato-grossenses exportadas.

O apoio incondicional de Medeiros a Bolsonaro acaba prejudicando Mato Grosso, por se tratar de mão única – o que é inconcebível nos meios políticos.

Esse é Dito Lucas, em imagem e caricatura

CHAPA – Medeiros compõe chapa partidária com Dito Lucas e a coronel Zózima.

Dito Lucas é o apelido de Benedito Lucas de Miranda, servidor comissionado lotado no gabinete de Medeiros, e que segundo questionamento da Justiça Eleitoral, não teria se desincompatibilizado em tempo hábil para se candidatar a primeiro suplente de senador,

Dito Lucas é escovado em disputas eleitorais. Em 2008 se elegeu vereador por Santo Antônio de Leverger, com 391 votos (o sétimo mais votado entre nove vereadores), pelo PPS. Quatro anos depois tentou ser vice-prefeito na chapa de Valter Sampaio (PSD), mas o eleitorado lhe deu um chega para la com apenas 457 votos.

A candidata a segunda suplente é a coronel aposentada da Polícia Militar, Zózima Dias dos Santos, que em parte do governo de Taques (2015/18) coordenou o projeto Rede Cidadã de proteção infantil e a adolescentes. Em 2014, no ano em que Taques se elegeu governador com apoio de Medeiros, Zózima concorreu para deputada estadual pelo PDT (à época o partido de Taques) recebendo 2.420 votos.

PS – Esté é o quinto capítulo da Série SENADO tem que ter PASSADO. O primeiro apresentou a série; o segundo focalizou o Procurador Mauro (PSOL); o terceiro, o tucano Nilson Leitão; e o quarto, Pedro Taques (SD).

A série é postada às terças-feiras, quintas e sábados.

Eduardo Gomes de Andrade – blogdoeduardogomes

FOTOS:

1 – Agência Senado

2 e 6 – Agência Câmara

3 – Site público Governo de Mato Grosso

4 – Facebook – Adria Muniz

5 – Meramente ilustrativa

7 – Divulgação deputado José Medeiros

8 – Facebook – Dito Lucas

 

 

 

José Medeirosmanchete