Fernando Collorencantou o Brasil com seu discurso de combate aos marajás. Jovem, dono de convincente oratória e prometendo mundos e fundos, esse fluminense criado nas Alagoas, depois de ser governador daquele estado, queria a Presidência da República. Collor tinha muito, mas faltava um bom vice. No começo de 1989, em busca do companheiro de chapa ideal, o Caçador de Marajá desembarcou em Brasília. Nas noites do poder e dos poderosos ele vislumbrou aquele que seria o nome ideal para uma dobradinha: o xomano Júlio Campos.
Collor sabia que seu desafio seria muito grande. Estavam em articulação as candidaturas de Ulysses Guimarães, Leonel Brizola, Paulo Maluf, Afif Domingos, Lula da Silva, Mário Covas, Roberto Freire, Aureliano Chaves, Enéas Carneiro, Marronzinho, Fernando Gabeira, Ronaldo Caiado e outros nove menos cotados. A ele não bastava uma chapa, mas a chapa. Nas intermináveis noites do Planalto Central, Collor chegou a Júlio Campos, um jovem político que foi governador de Mato Grosso e cumpria com destaque seu segundo mandato de deputado federal.
Collor e Júlio Campos conversaram uma, duas, cinco, 10, muitas vezes, mas o xomano mato-grossense não aceitou o convite, muito embora estivesse seduzido pela vontade de ser vice-presidente da República. O convidado explicou que em 1990 disputaria a eleição para o Senado, com ampla possibilidade de eleição.
Mesmo sem aceitar compor a chapa, Júlio Campos trouxe Collor a Mato Grosso. Juntos percorreram o Vale do Araguaia e o Nortão. Em Canarana ouviram o chororô dos produtores de arroz. Em Apiacás e Paranaíta, presenciaram a terra sem lei nos garimpos de ouro.
Collor engoliu em seco a decisão de Júlio Campos, mas pediu a ele que sugerisse um nome para sua chapa. O xomano disse que a melhor escolha seria a deputada federal sua colega de legislatura, Márcia Kubitschek, eleita pelo Distrito Federal e filha do lendário presidente Juscelino Kubitschek.
Collor montou chapa com Itamar Franco
Júlio Campos levou Collor ao apartamento de Márcia e foram recebidos por dona Sarah Kubitschek, mãe da deputada. A anfitriã argumentou que a filha atravessava um momento delicado de ordem familiar, mas encontrou uma saída para Collor: ligou para o senador mineiro e amigo da família Kubitschek, Itamar Franco, em final de mandato, e perguntou se ele aceitaria ser vice na chapa do Caçador de Marajá. Itamar gostou e disse o sim mais prazeroso de sua vida. Assim, Collor montou sua chapa vitoriosa, com seu fogo presidencial e a matreirice política mineira de Itamar.
Dona Sarah vibrou. Ela queria uma chapa sem ligação com o presidente João Figueiredo, que representava os militares de 1964 e tinha lá suas razões: em 8 de junho de 1964 o governo militar cassou o mandato de senador de Juscelino Kubitschek por Goiás e suspendeu seus direitos políticos, e mais tarde ela foi vítima de uma rasteira casuística do regime: com Juscelino cassado, a oposição mineira lançou dona Sara ao governo em 1965, mas o general Golbery do Couto e Silva criou um mecanismo de dupla exceção – a cassação estendia-se ao cônjuge do cassado. Sem dona Sara, a oposição mineira ao regime lançou ao governo o engenheiro civil Israel Pinheiro, que foi um dos pilares da construção de Brasília. Israel massacrou Roberto Resende, sobrinho de um dos líderes do golpe de 1964, Magalhães Pinto.
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Em 29 de dezembro de 1992 Itamar Franco assumiu a Presidência da República, após Collor sofrer impeachment. Se Júlio Campos fosse o vice-presidente, ao invés de Itamar, ele seria presidente.
Os irmãos Júlio e Jayme Campos
MEMÓRIA– Em 1990, um ano após a eleição de Collor, Júlio Campos foi eleito senador com 331.21 votos (60,58%) superando seu principal concorrente, Carlos Bezerra (PMDB) com 136.238 votos (24,92%). No mesmo pleito, Jayme Campos, irmão de Júlio Campos (PFL), elegeu-se governador de Mato Grosso encabeçando uma chapa com Osvaldo Sobrinho (PTB) de vice. Jayme recebeu 401.005 votos (66,85%) superando seu principal concorrente, Agripino Bonilha (PMDB), com 83.053 votos (13,85%).
Júlio Campos foi o segundo integrante do clã Campos – o maior da política mato-grossense – a recusar convite para uma chapa vitoriosa. Antes dele, seu pai, Júlio Domingos de Campos, o seu Fiote – que foi vereador e por duas vezes prefeito de Várzea Grande – praticamente foi intimado por Filinto Müller para ser primeiro suplente de sua chapa ao Senado, em 1970. Seo Fiote agradeceu, mas não aceitou. Filinto morreu em 11 de julho de 1973, num acidente aéreo em Paris. Seu primeiro suplente, Italívio Coelho, assumiu sua cadeira e concluiu o mandato.
O xomano Júlio Campos (União) permanece atuando politicamente: é o 1º vice-presidente da Assembleia. Jayme, seu irmão e correligionário é senador.