De facho de luz
Data significativa para o Estado Brasileiro, 5 de outubro celebra aniversário da Constituição da República Federativa do Brasil, que completa 29 anos. Batizada por seu principal artífice, o Dr. Ulysses Guimarães, de “Constituição Cidadã”, a carta magna que nos rege teve um capítulo humano protagonizado por dois constituintes mato-grossenses sob a bênção daquele que a promulgou.
Em 1986 Mato Grosso elegeu oito deputados federais com prerrogativas constituintes. Júlio Campos e Jonas Pinheiro, pelo PFL; Joaquim Sucena, Osvaldo Sobrinho e Rodrigues Palma, pelo PTB; Percival Muniz e Antero Paes de Barros, pelo PMDB; e Ubiratan Spinelli (PDS).
À época da elaboração da Constituição, Carlos Bezerra (PMDB) governava Mato Grosso e na composição de seu secretariado incluiu o deputado Percival Muniz, que foi substituído pelo suplente e correligionário Norberto Schwantes.
Vítima de um câncer de pele, resultado de suas andanças pelo sol escaldante de Mato Grosso, onde fundou as cidades de Água Boa, Canarana, Querência e Terra Nova do Norte, Schwantes fechou os olhos para sempre em 17 de setembro de 1988. Gaúcho, pastor luterano, jornalista, colonizador, cooperativista e militante da causa democrática, Schwantes tanto contribuiu com o desenvolvimento da terra que adotou quanto com a formatação da Constituição em vigor.
Em Brasília, Schwantes ganhou a simpatia do Dr. Ulysses Guimarães, que era um homem inteiramente voltado para a atividade política e muito fechado para diálogos que não fossem políticos. Juntando a habilidade humana do evangelizador com a sagacidade do colonizador, a malícia do político e o atrevimento – no bom sentido – do jornalista, o suplente de Percival caiu nas graças do homem que simbolizava a resistência democrática ao regime de 1964, recém-sepultado.
A enfermidade de Schwantes não mais permitia que ele comparecesse ao plenário. O homem que resolveu tantos problemas agrários no seu Rio Grande do Sul ao trazer para Mato Grosso milhares de agricultores, comerciantes, professores e tantos outros que atuavam em diversas atividades, e que a eles descortinou o horizonte de um novo mundo no centro da América do Sul, para que sonhassem, vivessem e crescessem, não resistiu. Mato Grosso perdeu o maior vulto que viveu entre os seus no século XX.
O líder constituinte convocou Percival para reassumir sua cadeira, mas o fez com o coração transbordando de respeito à memória de Schwantes. Na cerimônia de promulgação, com os olhos do mundo voltados para o ato em Brasília, o Dr. Ulysses Guimarães acrescentou post mortem a assinatura de Schwantes à Constituição. Assim, a legislatura constituinte teve um deputado a mais. Tratou-se do velho, tradicional e bom jeitinho brasileiro chancelando o conjunto de leis que nos rege.
Schwantes foi um facho de luz nas trevas do vazio demográfico mato-grossense no Araguaia e no Nortão, nos anos 1970 e 1980. Sua memória merece aquela deferência.
Eduardo Gomes de Andrade é jornalista
eduardo@diariodecuiaba.com.br
PS
Artigo publicado no Jornal Diário de Cuiabá edição 5 outubro 2018 Pág. A2 e na sua versão digital www.diariodecuiaba.com.br
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