Boa Midia

Escrever para curar o tédio

No combate da vida contemporânea, continuamente expostos a todo tipo de situações de estresse, são muitos os seres humanos que se veem na contingência de lançar mão de defesas para sobreviver, pelo menos. Ou, no limite do provável, para alcançar o sonho de viver melhor.

A canção sertaneja “Disco voador”, de Diogo Mulero, o Biá da dupla Biá e Bolinha, põe o dedo nessa ferida, e gatilho, já no ano de 1955. Vejam bem: em 1955, há mais de 70 anos, portanto, um tempo quando o mundo ainda não havia entrado na era da globalização e a depressão ainda não tinha o status de “mal do século”. No trecho em questão, diz a letra da música: “Os homens do nosso planeta dão a impressão que já não têm mais crença / em vez de fabricar remédio pra curar o tédio e outras doenças / inventam armas de hidrogênio, usam o seu gênio fabricando bomba / mas não se esqueçam que por mais que cresçam que perante Deus qualquer gigante tomba”.

Antevendo um tempo (este tempo), que já então se anunciava, quando cada vez mais gente se vê presa do tédio e da depressão, o compositor apontava para a busca de soluções, porém baseada em Deus. Uma saída pela observância aos preceitos da religião católica, como, aliás, convinha àqueles artistas caipiras.
Já eu, desde sempre, não pra curar e sim pra prevenir o tédio, a depressão, a insônia e outras doenças, utilizo em meu proveito o ler e o escrever. O ler, pouco, por se tratar de uma ação mais passiva; o escrever, muito, porque ativo.
Não tanto quanto eu gostaria e acho recomendável, mas às vezes, sim, pelo menos.

Escrever me dá uma sensação de poder, de dominar bem o meu instrumento de interferir positivamente na realidade. Parafraseando Carlos Drummond de Andrade, em “A flor e a náusea” (Meu ódio é o melhor de mim. Com ele me salvo e dou a poucos uma esperança mínima), digo que o ato de escrever me salvou, há tempos, e espero que com ele eu consiga dar a uns poucos uma esperança mínima.

Pode ser uma esperança vã, uma quimera, uma utopia, mas que existe, existe.

Marinaldo Custódio é jornalista, escritor e mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

mcmarinaldo@hotmail.com

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