Boa Midia

Série TRANSPARÊNCIA (15) – Mais que professora: uma lição de vida

 

 

 

Em homenagem ao Outubro Rosablogdoeduardogomes reproduz sua publicação de 25 de junho focalizando o capítulo 15 da série “TRANSPARÊNCIA” sobre as eleições majoritárias em Mato Grosso, que mostra o perfil de Maria Lúcia (PCdoB), candidata ao Senado .  Maria Lúcia participa da coligação liderada pelo senador republicano e candidato a governador Wellington Fagundes, com 10 partidos.

 

 

Pequena, franzina, a menina se segurava com as duas mãos na corda de bacalhau que amarrava os latões de leite de 50 litros, para que não dançassem pela carroceria. Para segurar o embornal com os livros, cadernos, lápis e apontador ela pisava sobre ele. A cada 500, 600 metros o motorista parava para receber mais leite. Assim, ao longo de 41 quilômetros o caminhão leiteiro que lhe dava carona. Depois retomava o percurso pela estradinha esburacada, ora coberta por um canudo de poeira ora transformada num atoleiro sem fim na ligação de Sandovalina, onde morava, com Pirapozinho, onde estudava, no interior paulista.

A aventura na carroceria do caminhão leiteiro não era diária. Acontecia quando o velho ônibus que fazia a linha naquele trecho, quebrava. Havia risco, mas ela sequer tinha consciência disso e junto ao grupo de outras crianças de sua idade, brincava com a pureza e inocência dos anjos.

Esse roteiro a levava para 5ª série em Pirapozinho. A aventura não era somente chegar: ela se completava com o malabarismo para manter impecavelmente limpo o uniforme escolar, coisa que todos do grupo tiravam de letra usando um guarda-pó – vestimenta de proteção muito comum à época.

Sua infância não foi fácil, mas mesmo assim encontrava tempo para devorar boa parte do acervo da biblioteca da prefeitura, onde palmilhou os textos de Dostoievski, Tolstói, Victor Hugo, Machado de Assis, Jorge Amado, outros autores e gostosos contos e histórias infantis. Com uma pontada de orgulho seus pais acompanhavam suas proezas de leitora.

Entre uma viagem e outra a menina entrou na adolescência e depois de uma mudança de endereço escolar havia concluído o curso Normal em Presidente Prudente, a cidade mais importante da região de Sandovalina. Normalista e sonhadora, em 1971 deixou a Faculdade de Letras de Tupã, com um canudo debaixo do braço.

Recém-formada, em fevereiro de 1973 desembarcou em Cuiabá, foi enleada por uma conspiração amorosa formada pelo calor, o azul do céu e o quê de encanto dessa cidade que brotou bem no centro da América do Sul. À época, homens e máquinas trabalhavam “em ritmo de Brasília”, como se dizia, em alusão ao piscar de olhos que foi a construção da capital federal. A correria era para concluir a construção da Universidade Federal (UFMT) criada em 10 de dezembro de 1970.

Encantada pelo calor e o azul do céu, bateu às portas da UFMT. Foi atendida por Gervásio Leite. Esse encontro da menina-mulher com a Universidade em construção foi o primeiro passo de uma caminhada ditada por uma paixão avassaladora ao longo de 45 anos ininterruptos, que a cada segundo mais e mais as fez complemento uma da outra e vice-versa. Esse quase meio século de boa e salutar cumplicidade resultou numa arejada, fértil e fabulosa relação bem proveitosa para ambas. Para a normalista foi mais que uma função, pela multiplicidade de suas atribuiçõessem abrir mão da função de professora – pois lhe proporcionou amizades sinceras, abriu horizontes profissionais com conquistas iguais ao mestrado e doutorado. Para a Instituição virou marco referencial, pois aquela professora que no ontem era menina e se segurava na corda de bacalhau na carroceria do caminhão que a levava pra escola, foi agente da sua maior guinada física no campus de sua sede em Cuiabá e nos demais campi.

Deputado constituinte em 1947, presidente da OAB regional, desembargador do Tribunal de Justiça, escritor com várias obras publicadas, membro e presidente da Academia Mato-grossense de Letras, jornalista e professor da UFMT, Gervásio Leite que a acolheu foi uma das figuras mais notáveis de Mato Grosso em sua época.

Palmo a palmo. Tijolo a tijolo Mato Grosso ganhou sua UFMT, uma Universidade que tem na sua argamassa impressões digitais de figuras abnegadas que deram o melhor de sua juventude para sua criação e consolidação – num ponto de transição entre a baixa densidade demográfica e o vazio populacional nos anos 1970 – de um centro irradiador de ciência, cultura, saber na amplitude da palavra.

As digitais da menina que se segurava na corda de bacalhau que prendia os latões de leite na carroceria do caminhão que era seu improvisado ônibus escolar estão no histórico da UFMT, a exemplo das digitais do primeiro reitor Gabriel Novis Neves. Melhor: povoam mentes e corações de milhares de alunos e ex-alunos, de servidores e professores daquela Instituição.

Caminheira desde o nascimento em Nova América, interior paulista, a menina que se segurava na corda de bacalhau na carroceira do caminhão encontrou ninho em Cuiabá, onde inicialmente foi hóspede do hotel de dona Teresa e a cada nascer do sol conquistou fragmentos da cidadania cuiabana que adquiriu plenamente e feliz compartilha com o marido Renato e os herdeiros Luciana, Renatinho, Jansen e Janaína, pois no teto onde vive a verdadeira família não há distinção entre filhos e genros, e todos formam a Perradinha.

Aquela menina que se segurava na corda de bacalhau que prendia os latões de leite na carroceria do caminhão é tudo isso na UFMT e também cidadã com posicionamento ideológico bem definido. Filiada ao PCdoB, ganhou de seu partido a indicação para ser homologada sua candidata ao Senado neste ano, numa coligação que terá o senador republicano Wellington Fagundes enquanto postulante ao governo.

Mesmo em se tratando de figura pública conhecida Mato Grosso afora, militante politica e pré-candidata ao Senado, até então nunca a havia entrevistado. Para a série, a ouvi. Fui presenteado com um relatório de suas atividades enquanto reitora da UFMT por oito anos, mas não aproveitei seu conteúdo neste capítulo – na correria, sequer o li, mas o farei o mais rápido possível.

Nossa conversa durou cerca de 40 minutos e foi acompanhada pelo presidente regional do PCdoB, professor Manoel Motta, que é suplente do senador Wellington Fagundes. Guardei a melhor admiração possível da minha entrevistada. Pra cada um dos meus modestos questionamentos ela tinha resposta convincente e numa delas me levou a refletir sobre um fato interessante: Mato Grosso tem perfil econômico de polo exportador de commodities agrícolas – o detalhe é que 32,17% do nosso volume exportado em 2017 teve por destino a China comunista, que é o grande parceiro comercial do agronegócio que tem Cuiabá enquanto capital. Em dólares a exportação global foi de US$ 14,7 bilhões (FOB) e os mandarins responderam por US$ 4,7 bilhões (FOB). Articulada, provou por “a” mais “b” que a cadeia agropecuária é imprescindível e que distribui renda e ao mesmo tempo gera emprego tanto no campo quanto na cidade.

Após a entrevista deixei seu gabinete convicto que ela enquanto senadora poderá fortalecer ainda mais os laços do nosso agronegócio com Pequim para que Mato Grosso possa fazer o verdadeiro negócio da China exportando mais e recebendo investimentos chineses. Aquela menina que se segurava na corda de bacalhau na carroceria do caminhão é a professora e ex-reitora da UFMT Maria Lúcia Cavalli Neder, pré-candidata ao Senado e que conscientemente ou não costuma dizer “se Deus quiser”. Em suma trata-se de uma professora que a todos ensina com sua lição de vida.

 

Eduardo Gomes/blogdoeduardogomes

 

Capítulos anteriores;

 

1 – PPP Caipira nasce da ousadia de Pivetta

2 – Suplente de última hora chega ao Senado

3 – Riva mesmo caido derrota Taques

4 – Páginas da vida

5 – Leitão, o único preso entre os pré-candidatos ao Senado e governo

6 – Carona na Arca de Noé

7 – O dedo de Kassab

8 – Taques e o cadeado na hidrovia

9 – Escândalos tomam discurso moralista de Pedro Taques

10 – O temperamento de Jayme Campos.

11 – Rossato, político profissional que diz não ser político.

12 – Selma aplaina caminho ao Senado.

13 – Assembleia Legislativa no fundo do poço.

14 – Blairo e o mistério que o afasta da eleição

1 comentário
  1. Raimundinho Diz

    Professora o meu voto é da senhora apesar do seu partido

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